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Para onde vão todas coisas que não dissemos?

Para onde vão todas coisas que não dissemos? Essa é uma pergunta que muitas pessoas se fazem. Algumas ficam presas dentro de nós. Outras conseguimos elaborar em um espaço seguro, como a terapia. Mas ignorar as coisas, muitas vezes pode ser pior. Fingir que as emoções não existem ou que as coisas que não aconteceram não faz elas desaparecerem. Quando um relacionamento chega ao fim, pouco importa quem se afastou de quem primeiro. Mas há quem se prende na ideia de que se afastou antes – em uma tentativa de controlar a narrativa, como se isso importasse. O fim significa que algo não estava funcionando e foi se desgastando ao longo do tempo. Nenhum fim acontece por mero acaso. Às vezes, quando somos levados ao limite, existem relações que não têm salvação – todos limites já foram cruzados e não há razão para impor limites, somente aceitar que o ciclo chegou ao fim. Isto não significa que você guarde algum rancor ou deseje mal para a pessoa, significa que você decidiu por sua saúde mental em...

Casa de Ensaio: Educando os jovens para a vida

Professor e ex-aluno da Casa de Ensaio, Eduardo Ribeiro
conta como a organização mudou sua vida e a de
muitos jovens.
Foto: Ben Oliveira
Imagine a cena: dez adolescentes em uma ciranda de roda cantando, enquanto um dos jovens está dentro da roda com os olhos vendados. Incapaz de enxergar, o adolescente tem que tocar em algum dos jovens e descobrir quem é. Você poderia pensar que voltou no tempo ao observar este momento, já que atualmente é muito difícil enxergar as crianças e adolescentes brincando desta forma, mas a imagem relatada realmente aconteceu nos dias de hoje.

A Casa de Ensaio é uma organização fundada por Lais Doria e Artur Monteiro de Barros, em 1996, com um projeto social de proporcionar uma transformação social e cultural às crianças e adolescentes, por meio da transmissão de valores e ao despertar em cada um dos indivíduos os seus talentos e sonhos. Com apenas um ano e meio de participação no projeto, para a estudante Luana Carolina, de 17 anos, a experiência está sendo maravilhosa. “Nós aprendemos a ser cidadãos aqui. Nós aprendemos valores, temos diversas aulas e diálogos sobre princípios. É para formar jovens que vão mudar o mundo”, relata.

O ex-aluno e atual professor da Casa de Ensaio, Eduardo Ribeiro, de 21 anos de idade, entrou em 2002 e está há 9 anos dentro da instituição. Aos 11 anos, o jovem entrou como aluno para fazer o curso, “Nessa rua tem talento”, em uma época em que as aulas aconteciam somente aos finais de semana. “Eu aprendi aqui a me relacionar com as pessoas. Eu comecei a aprender a conviver com todos os tipos de pessoas possíveis. Autonomia também foi uma coisa que veio para a minha vida. Comecei a ter acesso a mais bens culturais”, narra.

O projeto criado por Lais Doria era voltado aos meninos de rua e oferecia aulas de teatro, dança e música. Em 2006, a Casa de Ensaio começou a funcionar durante a semana. “Nós não tínhamos sede. O projeto emprestava uma sala durante os finais de semana. Tudo o que a gente tem é doado”, conta o jovem. Neste mesmo ano, Eduardo Ribeiro, o professor que começou como aluno e está há mais tempo participando da Casa de Ensaio, passou por um processo chamado de aluno-monitor, um treinamento recebido para trabalhar como professor do lugar. “Eu fiquei um ano sendo preparado. Eu parei de fazer as aulas, para assisti-las”, lembra.

Jovens da Casa de Ensaio se preparando para as brincadeiras de infância
Foto:
Ben Oliveira
Após virar curso, foram montadas várias salas dentro da Casa. Além das aulas de teatro, dança e música, foram acrescentadas literatura, artes visuais, cinema e também webarte. “O que eu acho mais legal do curso, que é como se fosse na escola ou faculdade, cada ano eles aprendem uma coisa”, narra Eduardo Ribeiro. O professor explica que no primeiro ano é trabalho bastante a cultura da infância, por exemplo, com jogos tradicionais, que hoje em dia, as crianças quase não brincam mais; Na literatura, os jovens lêem os contos infantis; Na música, aprendem as cantigas de roda; Na dança, os primeiros movimentos. Já no segundo ano, são aprendidos os jogos teatrais, as músicas de raíz, diversos estilos de dança, na literatura as poesias e clássicos tomam o lugar dos livros infantis.

“O objetivo maior da brincadeira infantil na Casa é que eles brinquem, divirtam-se com o coletivo sem criticas, sem julgamento e tenham acesso a uma brincadeira de infância que eles não conheciam. Nós mantemos a criança viva dentro de todo mundo o tempo inteiro, até para eles ficarem mais soltos no palco”, conta Eduardo Ribeiro. Ele ministra aulas de cultura da infância, que é a área que mais gosta, além de coordenar o teatro e os eventos, seja levando os alunos para assistir espetáculos, trazer artistas e palestrantes para se apresentarem ou ajudando com a seleção de elenco e cenas.

Com tanto incentivo a cultura e apresentação de espetáculos, pode-se imaginar erroneamente que a função da Casa de Ensaio é a de formar artistas. “A idéia da Casa não é formar atores e bailarinos. Nós não temos esse foco. Nós plantamos a sementinha para eles buscarem o sonho deles, mas eles não saem daqui formados”, conta Ribeiro. A Casa de Ensaio também tem outros programas, como a Trupe da Casa, um grupo profissional formado por ex-alunos, que estudam e montam os espetáculos; O programa Abre a Roda, em que a idéia é sempre trazer pessoas para ministrar oficinas ou apresentar espetáculos; Uma biblioteca que é ponto de leitura e tem um trabalho legal de incentivo à leitura; O programa Iluminando, com oficinas que são oferecidas a professores e outras pessoas, que não são só alunos da Casa; O Cine Casa, um cine clube que acontece uma vez por semana, onde os alunos têm acesso a conhecimentos, por meio de filmes mais culturais e legendados e aprendem a se expressar melhor sobre o enredo, o cenário e figurino.

Com duração de no mínimo cinco anos, os alunos entram na Casa de Ensaio e são divididos em turmas com idades parecidas e de acordo com o nível no projeto. “Nós usamos o curso, o teatro, as oficinas artísticas, para que os alunos aprendam a viver em grupo. Nós temos um cuidado aqui dentro da Casa, em que eles aprendem muitos valores. Muitos alunos chegam muito violentos. É uma coisa que acontece de mais. Nós percebemos que as escolas estão muito violentas, então usamos a arte para sensibilizar essas crianças”, relata Eduardo.

Atualmente a Casa de Ensaio tem 100 alunos em média, com uma faixa etária de 10 a 17 anos. As inscrições são abertas anualmente e são abertas no máximo 130 vagas, com foco nos alunos de 10 a 13 anos, pois a idéia é de que os adolescentes passem essa fase turbulenta e trabalhem através das oficinas artísticas estas transformações. “Nós não formamos cidadãos, porque todos nascem cidadãos, o nosso maior foco é que eles sejam pessoas melhores e comecem a ajudar a ter um mundo melhor, com menos violência e mais generosidade”, justifica Eduardo Ribeiro.

Nathalia Valdez, de 16 anos, está há 6 na Casa de Ensaio e contou que é muito bom fazer parte do projeto, pois faz muitos amigos e aprende várias oficinas legais, inclusive a de canto, que é a sua favorita. “Quando eu entrei era meio tímida, eu me enturmo fácil agora. Eu mudei o meu jeito de ser. Aqui nós aprendemos sobre coisas que não aprendemos na escola, fazemos amigos que vamos levar para a vida inteira e acrescentamos muito na nossa vida”, admite. "Tudo o que eu sou hoje, eu devo à Casa de Ensaio, a todas as pessoas que eu conheci aqui dentro e principalmente a Laís, que é minha grande mestre e me ensinou tudo", declara Eduardo Ribeiro.

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