Pular para o conteúdo principal

Destaques

Âncora

Ancorar é encontrar um espaço seguro mesmo diante do caos. É ouvir uma música e se permitir encontrar paz, mesmo quando as coisas estão fora de controle. É pensar na sua pessoa favorita e sentir as emoções reguladas. É saber que você pode confiar em quem conversa o dia inteiro. É confiar que mesmo diante da ambiguidade, ele vai honrar a promessa que fizeram. É ressignificar o que antes poderia ser visto como algo preocupante e aceitar que era mais do que seus diagnósticos. Era saber que não havia melhor pessoa que o entendesse nos últimos tempos. Era brincar com as linhas e nossas indefinições. Era saber que de tanto ensaiar situações de possíveis crises, que ele saberia notar se algo estivesse diferente. Cada um dos seus sinais. Escrevia para lembrar e também para esquecer. Escrevia para lembrar dos ciclos fechados e agradecer o que estava aberto. Era entender o quanto estava sufocado e que, às vezes, um olhar certo bastava. Escrevia para aceitar que as coisas poderiam mudar. Que em u...

A Viagem da Escrita

Esta é a primeira vez que eu faço isto. Estou sozinho, sentado no banco de um parque, cercado pelas árvores e aves, em frente a uma lagoa.

Escrever é como viajar. Para aproveitar ao máximo sua viagem é preciso se desconectar. Ficar longe do celular, do computador e tudo mais que possa te distrair de viver o agora. Estar presente inteiro, sem se fragmentar e prender a tantas atividades.

A viagem começa antes de colocar o pé na estrada. Estou com uma caneta e um caderninho, mas poderia estar sem nenhum instrumento. Aliás, carregamos nossa melhor ferramenta, não importa aonde vamos, nosso cérebro está sempre ligado e registrando tudo o que acontece, seja a nível consciente ou subconsciente.

Embora eu deseje que o mundo pare por um instante, tudo ao meu redor continua em movimento. Talvez esse seja um dos principais erros das pessoas, esperar que os outros parem só porque elas gostariam. A natureza gentilmente mostra que a vida é ininterrupta, como um mercado 24 horas, às vezes com mais movimento, às vezes com menos, mas nunca parado.

Levanto-me do banco. As formigas decidem dançar sobre a minha pele. Mesmo sem sentir os seus movimentos, estes insetos também querem deixar suas marcas – quem é que não quer? Desde o momento em que nascemos estamos deixando nossas pegadas e impressões por onde passamos. Saio da minha zona de conforto, um banco na sombra e ando sob o sol forte até encontrar outro lugar aconchegante.

Sou um estrangeiro neste parque, e como bom hóspede, eu não posso reclamar daqueles que estão aqui há mais tempo. Embora nós, humanos, usamos o local para socializar e realizar inúmeras atividades, somos e sempre seremos meros visitantes.

Não adianta tentar fugir, os pássaros e as formigas estão em todo lugar. Está tão quente que até mesmo as capivaras estão se protegendo do sol. Como eu disse, a vida é dinâmica, enquanto um casal está sentado em um banco a alguns metros de onde eu estou, um homem está correndo pelo parque. Solidão e paixão dividem o mesmo espaço, como os homens e os bichos.

Não me atrevo a tentar adivinhar quanto tempo se passou desde que cheguei aqui. À medida que minha mente se movimenta com ideias e minhas mãos lançam palavras no papel, o sol tira uma folga e o vento refresca minha pele, que libera um perfume agradável aos pernilongos.

Tudo muda o tempo todo. O casal que estava se beijando e trocando carícias agora está brigando, o homem que corria agora está parado. O jovem e a moça soltam uma gargalhada e se beijam novamente, como na brincadeira da cadeira em que cada um se levanta e anda ao redor delas enquanto a música toca, se sentando somente quando o som para, chegou a minha vez de circular de novo.

Vou até uma torneira. A água quente cede espaço para a água fria, assim como o ar entra e sai dos meus pulmões, tudo é tão dinâmico. Ando alguns minutos até chegar ao banco próximo a uma queda d’água. Gosto do som da água sendo puxada para baixo e caindo com força. A vida aqui é tão natural e relaxante, diferente da correria do dia-a-dia, das obrigações, estresse e compromissos.

Se escrever é viajar, todos deveriam tirar um dia para mergulharem dentro de si mesmos. Se a viagem for boa, você levará horas e dias pensando nela, se não for o que você esperava, ao menos por alguns minutos sua mente, sua alma e seu corpo terão descansados.

Fecho os olho e me concentro no som da água caindo. Sinto meu corpo sendo lavado e todos os meus pensamentos se soltando de mim, alguns ficaram no parque, outros foram para a página deste caderno. Sinto-me mais leve, mais líquido, mais forte.

Olho para o céu e caminho até a saída do parque. Não estou nem meio cheio nem meio vazio, estou inteiro.

*Texto: Ben Oliveira

Mais lidas da semana