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Destaques

Sobre Reler Livros

Reler um livro era como tocar um tecido que você já usou várias vezes, como se fosse pela primeira vez. A textura parecia diferente; o cheiro não era o mesmo; Era impossível não imaginar na palavra que circulava pela mente: diferente.  E por que esperar pelo impossível igual? O leitor não era o mesmo. Um intervalo de tempo considerável havia se passado. O personagem que costumava ser o favorito talvez agora seja outro. O texto que escreveria a respeito do livro talvez jamais fosse igual. Era um diferente leitor, um diferente livro, uma diferente interpretação. Ler pelo mero prazer era diferente de ler pensando na resenha que escreveria em seguida. Escolher o livro de forma aleatória era diferente de já tê-lo em mente. Reler era diferente de ler, mas sobretudo, era uma nova forma de leitura: os detalhes que antes não chamavam a atenção, agora pareciam brilhar nas páginas. Não estava no mesmo lugar em que estava quando o leu pela primeira vez. Sua pele não era a mesma, tampouco seu céreb

Emprestar ou não emprestar livros

Todo amante de livros, como eu, em algum momento da vida vai lidar com o dilema: Emprestar ou não emprestar um livro. Lembro-me de quando não era tão apegado aos livros. Gostava de ler obras que já tivesse em casa, na biblioteca do meu pai ou nas bibliotecas de outras instituições, mas quase nunca comprava. Sempre que algum colega recomendava uma leitura, mas não queria emprestar o livro, eu estranhava. Agora? Nem tanto.

Nunca fui muito apegado às coisas materiais. Eu era o tipo de pessoa que comprava e ganhava livros e quando gostava muito, não só recomendava aos amigos, como emprestava para alguns e os dava para outros. Eu nunca tive a intenção de continuar morando na minha cidade e sempre achei que quanto mais eu acumulasse objetos, mais difícil seria quando chegasse o momento. Então, depois de ter morado um ano em Florianópolis e voltado para Campo Grande, eu já estava mais calmo.

Em 2012, comecei a comprar mais livros. O empréstimo de livros na biblioteca já não era suficiente. Eu precisava sublinhar os meus trechos favoritos – para o espanto de alguns leitores, costumo fazer isto com caneta –, fazer anotações e ter o livro por perto sempre que precisasse reler ou tirar alguma dúvida. Neste mesmo ano, passei a escrever meus primeiros contos de ficção. A literatura me parecia mais atraente do que o jornalismo. Enquanto uma me oferecia um universo extraordinário, o outro me bombardeava com a obviedade e expiração diária. E a frase tão repetida: “Para escrever bem é preciso ler muito”, é um dos motivos pelos quais eu gosto tanto de ler e preciso ter os meus próprios livros, para poder analisá-los quando precisar, estudar os movimentos e técnicas usadas pelo escritor e a maneira que a história foi narrada. Logo, para um escritor ou até mesmo um leitor apaixonado por livros, estar sempre atualizando com as novas obras ou ter seus próprios exemplares dos clássicos da literatura exige investimento financeiro. Quando um livro é emprestado e não é devolvido, a frustração não é só para o leitor que precisou comprar com o seu dinheiro e muitas vezes abriu mão de um gasto que a outra pessoa não teve e optou por fazer algo que gostava que não fosse relacionado à leitura – novidade para quem não percebe, ler livros também é prazeroso –, mas também aos autores que não gostariam de ver seus livros na casa de alguém que não vai ler.

Voltando ao meu vício por livros. Tenho aproximadamente 140 livros no meu quarto, menos da metade dos livros que já li e me lembro, pela contagem atual marcada no Skoob, são 326 livros lidos, sem mencionar os que eu já li e não faço ideia. Para quem gosta de livros não há quantidade suficiente. Viramos uma espécie de acumulador. Acumulamos não só livros físicos, mas conhecimento, informação, viagens para outros mundos, experiência dos protagonistas, vidas que queríamos para nós, coisas que não suportaríamos enfrentar, enfim, construímos nossa identidade a partir do que já lemos.

Noite passada, emprestei um livro para o meu namorado. Não era um livro que eu era muito apegado, mesmo assim a sensação não é das melhores. Não me preocupo, pois sei que ele vai ler e me devolver. No entanto, quando muitas pessoas olham para um leitor e sua coleção de livros e não conseguem entender porque eles não gostam de emprestar, não podemos julgar. A verdade é que muitos dos livros não são devolvidos, às vezes são lidos, às vezes a pessoa não leu nem o primeiro capítulo, muitas vezes quando o livro é devolvido parece que o coitado foi à guerra, enquanto há aquele colega que diz “gostaria de ler mais. Me empresta?”, mas no fundo fica só no plano das ideias e nunca coloca em prática.

Livros que encontrei na biblioteca do meu pai
E como é gostoso pegar algum livro emprestado, principalmente quando estamos sem dinheiro no momento para comprar novas obras. Hoje mesmo, entrei na biblioteca do meu pai e encontrei alguns livros sobre escrita, um sobre budismo e um romance que eu já havia lido e preciso reler, pois era muito novo quando li e não me lembro de nada. Quando nos acostumamos a comprar livros, novos ou usados, e desejamos construir nossa própria biblioteca, mesmo quando pegamos emprestados livros que gostaríamos de ler, a sensação não é a mesma. Não posso sublinhar, anotar, pois o empréstimo fornece a ideia de que o livro deverá se devolvido e o principal, de que não é meu, embora nem todos pensem desta maneira, colocando a pessoa que o emprestou na situação chata de ficar perguntando sobre o livro várias vezes.

Quando um leitor não deseja emprestar os seus livros é porque os mesmos já não são meros objetos, mas trazem uma carga emocional. Eu nunca entendia e confesso, como muitas pessoas pensam, na época também achei que fosse egoísmo. Não é egoísmo, é cuidar do que é seu, do que para outra pessoa pode não ser tão importante quanto foi para você. Há quem anote o nome da pessoa e o título do livro emprestado. Há quem pegue outro livro emprestado ao mesmo tempo, de forma que se um for, o outro fica como refém. Há quem diga não, não importa quantas vezes o outro peça, não porque seja  um porre – talvez até seja –, mas porque já emprestou tantos livros que não retornaram e quando precisaram ou sentiram vontade de reler o livro, já não se lembrava para quem tinha emprestado, porque a pessoa nunca se deu ao trabalho de ler e devolver o livro que pegou emprestado.

Um livro na biblioteca ajuda a manter a estrutura e os outros em pé. Quando um livro é retirado, um buraco se forma e dependendo do grau do apego ao livro, é como se este buraco tivesse sido feito no leitor também. O vazio que foi preenchido por uma leitura está de volta. Bom, não sou tão neurótico assim com meus livros, no entanto confesso que não sou fã de emprestá-los. Há, porém, pessoas que antes mesmo de emprestar o livro, isto quando chegam a fazer, emprestam algum que não gostava muito, sabendo que há uma chance dele não retornar.

As imagens são fortes para quem não gosta de emprestar livros.

Recentemente a biblioteca da universidade em que eu frequentava fez uma ação, mostrando o que acontece com os livros emprestados e mal cuidados. Os livros estavam expostos, com páginas rasgadas, descolados, sublinhados (algo não aconselhável de se fazer a livros emprestados – mais uma vantagem de ter o seu próprio livro). Em frente aos pobres e danificados livros trazia as mensagens: “Mordido por um cachorro” e “arrancaram as minhas páginas”, entre outras. A imagem pode ser forte para leitores que nunca emprestam seus livros, levando-os a pensar: “Está vendo? Por isso não empresto meus livros”. Não dá para julgá-los, pois é a realidade, nem todos têm o mesmo cuidado com o que foi emprestado.

Antes de pedir um livro emprestado, então, o mínimo que a pessoa pode fazer é se comprometer a lê-lo, e se não tiver tempo ou disposição para isto, ao menos devolvê-lo inteiro. É preciso ser realista consigo mesmo. Quando um livro é pedido emprestado, o leitor está tão acostumado a uma leitura rápida por causa do seu hábito e paixão pelos livros, que ele imagina que o outro também lerá em pouco tempo. Mera ilusão. O livro lido em uma semana por alguns leitores, outras pessoas levam um ano inteiro enrolando para ler. Não é egoísmo, é cuidar do que tem valor para você e pode não ter o mesmo significado para outra pessoa. Acontece não só com livros, mas com qualquer outra coleção de objetos admirados por alguém. Na dúvida entre emprestar ou não livros, é preciso avaliar qual a necessidade da outra pessoa, se ela realmente vai ler o livro ou está se trapaceando e ter um grau de intimidade com ela para pedi-lo de volta caso a pessoa se esqueça de devolver. Afinal, sem essas amnésias e falta de comprometimento e cuidado de quem pega livros emprestados, os leitores não se sentiriam tão inseguros na hora de emprestar. Emprestar ou não livros é uma questão de opinião.

Comentários

  1. Acho que este é um "mal" que acomete todas as pessoas que são apaixonadas por livros, justamente porque sabemos o quão importantes eles são, verdadeiros companheiros. Comigo já aconteceu de tudo: emprestei e recebi de volta, emprestei não me lembro a quem e nunca mais vi. Kkkk Mas emprestar livros tb pode ser algo interessante quando nos proporciona trocas efetivas de conhecimento e opiniões diferenciadas. Pensemos pelo lado bom! Visite meu blog , lá também conto minhas paixonites pelos livros , dentre outras coisinhas : www.feiticosdobem.bligspot.com.br

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    Respostas
    1. Olá, Ildete! Muito obrigado pela visita e comentário!
      É muito gostoso quando emprestamos um livro e a pessoa se interessa, verdadeiramente, por ele. Rola essa troca bacana de pensamentos, opiniões, informações. O chato mesmo é quando a pessoa pede o livro, sabendo que não vai ler e acaba se esquecendo de devolver...
      Abraços!

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