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Um Natal diferente

Um Natal diferente. Um Natal sem carregar velhos fantasmas do passado, para se permitir viver o aqui e agora e encerrar um ciclo que já precisava ter encerrado faz tempo. Talvez por fora tudo fosse igual. Talvez tudo parecesse diferente. Mas a verdade era que alguns vínculos se tornavam pesados demais e não valiam a pena manter. Não, nenhuma relação unilateral valia o tempo. Escrevia para se lembrar o quanto algo assim parecia impossível há uns anos. Escrevia para dizer que pouco a pouco havia aprendido a se libertar. Se importava menos com o que os outros pensavam e focava nos próprios limites. Seria um Natal diferente, como deveria ser há anos. Algumas relações se desgastam com o tempo e não têm salvação, não importa o quanto você tente encaixar. De tanto ir deixando ir aos poucos ao longo dos anos, finalmente havia chegado a hora de se soltar de uma vez por todas. Escrevia para dizer o quanto era libertador e que não havia espaço para arrependimento, aliás, recomendava o mesmo ao ou...

O dia em que a professora chorou

Ela acordou pela manhã, tomou um banho de água gelada, comeu seu pão, bebeu café, deu um beijo nas duas filhas, abraçou o marido e saiu de casa. Todos os dias ela repetia as mesmas coisas. Não importava se estava com dor no corpo, enxaqueca, cansada ou triste. Ela amava o seu trabalho.


Ainda era cedo quando ela chegou à escola e entrou na sala dos professores. Ninguém podia imaginar a notícia que escutariam e como ela afetaria a jovem professora. A prefeitura atrasaria mais uma vez o pagamento.

– Assim não é possível! – berrou um dos professores.

– Eles acham que não temos contar para pagar? – lamentou outra.

– Precisamos fazer uma greve. Não podemos ficar de braços cruzados.

Ela só escutava. Remoía aquelas palavras dentro de si. Nada acertado, ela foi para a sala de aula.

– Bom dia, professora! – disse uma das alunas.

– Bom dia, minha querida!

A aula passou voando. Quando se deu conta, já estava na hora da chamada. 37 nomes. Ela dizia cada um dos nomes com toda paciência do mundo.

Quando chegou em casa, ela ligou a televisão e viu uma notícia sobre professores que ameaçavam entrar em greve. O prefeito alertava sobre os salários serem maiores do que as médias dos outros estados. Ela quase vomitou ao escutar aquilo. Trabalhava de manhã, à tarde e o pouco tempo que tinha durante a noite, ela preparava as aulas da semana. Era um trabalho que nunca acabava.

No outro dia, ela fez as mesmas coisas em casa e foi ao trabalho. Os outros professores falaram novamente na greve. Ela pensou nos alunos, nas aulas que precisaria repor, na importância da educação.

Os outros professores a viram indo para a sala de aula.

– Você não vem?

– E os meus alunos? A diretora não vai gostar nada disso.

– Pois ela que nos pague logo, então.

A professora foi para a sala e logo foi recebida com uma série de perguntas.

– Professora, vai ter aula hoje?

– O que é a tal da greve?

– É verdade que você está com preguiça de dar aula?

– Meus pais falaram que você ganha melhor do que eles e estavam reclamando. Por que?

Ela olhou para os alunos. Não sabia por onde começar a responder. Tantas dúvidas, tantas preocupações. O salário do marido não seria suficiente para pagar as contas. Pensou em como a família teria que comer menos para sobreviver. Pensou em tudo, menos nas respostas.

Uma vontade de sair correndo a devorou. As lágrimas quentes lutavam pelo rosto; a garganta apertada; a dor no peito. Ela pegou as coisas e saiu o mais rápido que podia.

A diretora entrou na sala e se surpreendeu com a ausência da professora. Ela era uma das suas melhores funcionárias, fazia chuva ou sol, frio ou calor.

– Onde está a professora?

– A professora faltou! – gritaram os alunos ao mesmo tempo.

Ela sabia que se não fosse lutar pelos seus direitos seria incapaz de ensinar os seus alunos. Não era só uma questão de dinheiro. Ela se lembrou dos adolescentes que se inspiravam e tinham um carinho grande por ela, seus ensinamentos iam além da sala de aula. Naquele dia, ela preferiu reprovar diante dos olhos da diretora. Ela tinha mais uma aula para dar, uma aula sobre a vida.

*Ben Oliveira é escritor, blogueiro e jornalista por formação. É autor do livro de terror Escrita Maldita, publicado na Amazon e do livro de fantasia jovem Os Bruxos de São Cipriano: O Círculo (Vol.1), disponível no Wattpad. 

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