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Destaques

Sem talvez

Não havia talvez quando se tratava de pôr a própria saúde mental em primeiro lugar, especialmente quando o outro a estava negligenciando. Não havia talvez para continuar sustentando um relacionamento que não ia para frente, no qual o outro se negava a se responsabilizar e se colocava constantemente no papel de vítima. Não havia talvez quando você havia se transformado em uma espécie de terapeuta que tinha que ficar ouvindo reclamações e problemas constantes, se sentindo completamente drenado após cada interação. Já não havia espaço para o talvez. Talvez as coisas seriam diferentes se o outro tivesse o mesmo cuidado com a saúde mental que você tem. Talvez a fase ruim iria passar um dia. Talvez a pessoa ia parar de se pôr como vítima e começar a se responsabilizar. Eram muitos talvez que não tinha mais paciência para esperar. Então, não, já havia aguentado mais do que o suficiente. Não era responsável por lidar com os problemas do outro. Não era responsável por tentar levar leveza diante...

Resenha: Como Parar o Tempo – Matt Haig

Já imaginou quantas experiências boas e ruins alguém é capaz de viver quando sua existência dura mais do que a dos outros? No livro Como Parar o Tempo (How to Stop Time), do autor Matt Haig, o leitor é levado a conhecer as vivências de Tom Hazard, um homem que sabe muito mais do que pode contar aos outros e passa por um constante processo de reinvenção de si mesmo. A obra foi publicada no Brasil pela Editora Harper Collins, em 2017, com tradução de Carla Bitelli e Flávia Yacubian.


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Segredos podem ser pesados. Tão difícil quanto carregar memórias dolorosas que o assombram constantemente, para Tom, a ideia de não poder contar para outras pessoas sobre sua verdadeira identidade é algo que o provoca desconforto. Da mesma lição já aprendida com histórias de vampiros e imortais, ter uma vida longa pode ser cobiçada por algumas pessoas, mas pode ser visto como uma maldição para outras.

Quanto tempo é muito? Se em uma vida, todos passamos por vários altos e baixos, pelas descrições do narrador-protagonista em primeira pessoa, dá para viajar por algumas de suas memórias mais marcantes e reviver coisas que ele gostaria de ter repetido e outras que ele gostaria de ter mudado se tivesse a opção.

“Entendo o porquê disso tudo. Por que desejo me tornar professor de história. Preciso domar o passado. Isso é a história, ensiná-la e contá-la. É uma forma de dominá-la e ordená-la. Transformá-la em um animal de estimação. Mas a história que se viveu é diferente daquela que se lê num livro ou se vê numa tela. E algumas coisas do passado não são domesticáveis” – Matt Haig, Como Parar o Tempo

Uma sociedade secreta de pessoas que têm a condição que as impedem de envelhecer. Tom conta um pouco de sua experiência – ele próprio e as pessoas ao seu redor foram vítimas da maldade humana quando perceberem as poucas mudanças em seu rosto ao longo dos anos. Para garantir a própria vida e de seus colegas, o homem teve que cumprir ordens que nem sempre foram do seu agrado.

Entre os intervalos de séculos e diferentes locais que visitou ou viveu, o protagonista chega a conhecer personalidades culturais marcantes da história ocidental, como Shakespeare; Scott Fitzgerald e Zelda; Chaplin. O romance não é narrado de forma linear e a cada capítulo, o leitor é levado ou para um episódio do presente, ou para alguma das lembranças de Tom, que vão se costurando conforme ele vai contextualizando de que forma aquelas experiências o tocaram e fizeram parte de sua identidade.

“É estranho como o passado está próximo, mesmo quando o imaginamos tão distante. Estranho como ele salta de uma frase e o atinge. Estranho como cada objeto ou palavra pode abrigar um fantasma. O passado não é um único lugar. São muitos, e estão sempre prontos a emergir no presente” – Matt Haig, Como Parar o Tempo

Paralelamente a aventura fictícia, não dá para deixar de pensar em como os livros nos proporcionam oportunidades semelhantes, como a de encontrar e escutar as vozes de pensadores e nos deixar levar pelas biografias e obras literárias. Esse diálogo entre as próprias narrativas do protagonista é por si só uma ótima relação sobre como conectamos as memórias e ressignificamos as experiências.

Com um toque de drama, Tom é um personagem cativante por não esconder suas próprias dores e se mostrar disposto a seguir em frente, sempre refletindo sobre como essa jornada nômade de não poder ser ele mesmo completamente para os outros cobra um preço alto. As impossibilidades de se conectar de forma profunda com os outros e de compartilhar uma história de vida são só algumas das amarguras que o personagem tem que lidar, precisando escolher entre a obediência e permanência, ou ao mesmo destino daqueles que se recusam a fazer parte da sociedade secreta.

“O nome em si contém coisas demais. Contém todos que já me chamaram e todos de quem me escondi [...] Mas não é uma âncora. Pois uma âncora fixa. E eu não estou fixado. Posso continuar navegando pela vida, para sempre me sentindo assim? Um barco tem que parar em algum momento. Chegar a um porto, um ancoradouro, um destino, conhecido ou não. Precisa ir a algum lugar, e parar ali, senão, para que serve? Eu já fui tantas pessoas diferentes, desempenhei tantos papéis. Não sou uma pessoa. Sou uma multidão em um corpo” – Matt Haig, Como Parar o Tempo

Matt Haig escreveu um romance envolvente que nos faz refletir sobre a relação que construímos com o tempo, com nossas essências e com as incertezas da vida – reforçando a importância de aproveitar o presente, já que o futuro é sempre uma charada, não podemos mudar o passado e o tempo não é linear como gostaríamos, estamos sempre avançando e retrocedendo.

Sobre o autor – Matt Haig é um dos autores mais vendidos e prestigiados da Inglaterra. Entre seus sucessos se destacam The Radleys e The Humans, e seus livros juvenis receberam os prêmios Blue Peter Book Award e Smarties Book Prize, além de serem finalistas do Carnegie Medal. Seus livros já foram traduzidos para mais de trinta idiomas. Como Parar o Tempo já é um best-seller e seus direitos para o cinema foram comprados pelo ator Benedict Cumberbatch.

*Ben Oliveira é escritor, blogueiro, jornalista por formação e Asperger. É autor do livro de terror Escrita Maldita, publicado na Amazon e dos livros de fantasia jovem Os Bruxos de São Cipriano: O Círculo (Vol.1) O Livro (Vol. 2), disponíveis no Wattpad e na loja Kindle.

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