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Destaques

Palavras não ditas

Era uma vez um escritor que tinha tanta empatia por alguém próximo, que, muitas vezes, levava para a terapia problemas que não eram seus. Nem sempre sabia como ajudar. Não sabia como dizer não. Sempre estava disposto a ouvir. Até o dia em que se esgotou e se deu conta de que se as coisas não mudassem, ali não era seu lugar para ficar. Quando foi que precisou se diminuir tanto para caber nas expectativas do outro? O outro sequer sabia que seus posicionamentos ideológicos eram contrários e, vez ou outra, sofria com microagressões, mas se silenciava em bem da amizade – era quase como se vivesse uma vida dupla, da qual o outro desconhecia. Foi deixando um monstro crescer cada vez mais, um monstro alimentado pelo silêncio e que tanto se preocupava com o outro, que às vezes se deixava de lado. Para pessoas que estão familiarizadas com impor limites, o caso poderia ser bobeira, mas para ele, havia chegado a um estado de exaustão, no qual não queria voltar atrás. Estava exausto de ouvir proble...

Mesma língua

Estar com alguém que falava a mesma língua era algo tão importante, que ele só se dava conta quando encontrava o oposto do esperado. Se sentia um alienígena tentando fazer contato pela primeira vez, sabendo que havia um preço a se pagar se falhasse.

A mente girava e um desconforto subia dos pés à cabeça. Frustração, essa era a palavra que estava procurando para definir o que havia sentido, sentia e sentiria, quase como se estar em sintonia fosse um milagre inalcançável, que exigia uma fé que ele não sentia.

Era assim sempre que os dedos deslizavam pelo teclado e desistia de enviar uma mensagem. Era assim sempre que recebia uma mensagem nova, como se encarasse algo indecifrável. Era como se os dois estivessem condenados, em uma espécie de maldição da linguagem, capaz de aterrorizar quem testemunhasse.

A mente buscava por um consenso, mas as palavras e as atitudes eram tão diferentes que causavam uma série de nós nos pensamentos. De repente, já nem sabia como reagir e encontrava acolhimento no silêncio, ciente de que os dois falavam monólogos paralelos para si mesmos e não havia um fio vermelho que os conectavam.

Perguntava-se se chegaria o dia em que estariam na mesma página, da mesma história e as duas línguas se tornassem uma só, em uma dança espelhada, na qual a ansiedade cedia espaço para a tranquilidade e os dois deixassem de falar sozinhos. Uma espera que não sabia se valia a pena.

Talvez aceitar que as diferenças nunca seriam sobrepostas não era só uma maneira de estabelecer limites, mas de também ter empatia e compaixão pelo outro. Parar de lutar contra as diferenças e aceitar que sempre seriam assim, talvez era tudo o que precisava. Estavam destinados a não se encontrarem e a dor que os dois sentiam, em breve sumiria.

*Ben Oliveira é escritor, formado em jornalismo. Autor do livro de terror Escrita Maldita, publicado na Amazon e dos livros de fantasia jovem Os Bruxos de São Cipriano: O Círculo (Vol.1) e O Livro (Vol. 2), disponíveis no Wattpad e na loja Kindle.

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