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Destaques

Sem talvez

Não havia talvez quando se tratava de pôr a própria saúde mental em primeiro lugar, especialmente quando o outro a estava negligenciando. Não havia talvez para continuar sustentando um relacionamento que não ia para frente, no qual o outro se negava a se responsabilizar e se colocava constantemente no papel de vítima. Não havia talvez quando você havia se transformado em uma espécie de terapeuta que tinha que ficar ouvindo reclamações e problemas constantes, se sentindo completamente drenado após cada interação. Já não havia espaço para o talvez. Talvez as coisas seriam diferentes se o outro tivesse o mesmo cuidado com a saúde mental que você tem. Talvez a fase ruim iria passar um dia. Talvez a pessoa ia parar de se pôr como vítima e começar a se responsabilizar. Eram muitos talvez que não tinha mais paciência para esperar. Então, não, já havia aguentado mais do que o suficiente. Não era responsável por lidar com os problemas do outro. Não era responsável por tentar levar leveza diante...

Sentir leve

“Você parece tão leve”, escutou as palavras da psicóloga. Era como se ao deixar para trás o que estava pesando, estava recuperando sua leveza. “Quando foi a última vez que você se sentiu assim, tão leve?“, a pergunta era um convite para refletir e se dar conta de quanto tempo estava sentindo as coisas pesadas, sempre envolvido de uma forma ou outra nos desabafos e reclamações do outro. Se dera conta de que sua leveza vinha de antes de uma série de problemas acontecer e o outro depender  dele.

O peso do outro não precisa ser carregado por você. É somente quando nos damos conta disso que nos lembramos que mesmo a empatia tem limites e quem se vê muito envolvido nas questões emocionais do outro pode sofrer com esgotamento emocional e/ou fadiga por compaixão. Não, já havia pagado o preço uma vez por se importar demais, decidira que o melhor para sua saúde mental era seguir em frente sem o outro.

Mais do que uma fantasia da cabeça, era possível sentir no corpo, nas expressões e na mente o quanto estava diferente. Todo mundo sabe na teoria que ficar por perto de quem reclama faz mal à saúde, mas nem todos estão dispostos a encarar a realidade e se afastar quando necessário, nos vemos presos a um papel que sequer tínhamos escolhido.

Longe de encarar o fim como algo passivo, estava usando os dias com pequenas mudanças de comportamentos, pequenas formas de ativar o cérebro e cuidar da própria mente, dando uma onda de adeus diariamente, até que a mente estivesse completamente livre do peso do outro. Já estava sentindo diferença e o plano era continuar, até a mente encontrar novos vínculos saudáveis, novas formas de autoexpressão e novas maneiras de se relacionar, sem ter que abrir mão da própria saúde mental.

O adeus era um convite para novas pessoas. Pessoas que também conseguiam lidar com as coisas com leveza, tentando transformar dias ruins e protegendo a própria energia do outro. Depois que havia percebido um padrão de estar no papel de quem era drenado ou tinha que escutar problemas como uma espécie de terapeuta, se negara a se colocar nessas situações novamente. Com o tempo, escolheria opções mais saudáveis para se relacionar, desta vez consciente do que não queria passar novamente.

Então, deixar ir, que no início parecia uma ideia estranha, estava cada vez mais sendo naturalizada. Depois de tantos vídeos e textos sobre a importância de impor limites, fins de relacionamentos e cuidados com a saúde mental, se dera conta de que eles chegaram tarde demais, quando já não havia mais opção: não estava disposto a ouvir mais nada do outro. Desejava bem, mas também desejava distância, se libertando de um vínculo que mais parecia dependência emocional do que amizade e que de tanto ouvir o outro como vítima, agora sabia que era um vilão na história de alguém.

*Ben Oliveira é escritor, formado em jornalismo. Autor do livro de terror Escrita Maldita, publicado na Amazon e dos livros de fantasia jovem Os Bruxos de São Cipriano: O Círculo (Vol.1) e O Livro (Vol. 2), disponíveis no Wattpad e na loja Kindle.

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