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Doce Ilusão

Estaria mentindo se dissesse que mesmo após duas semanas sem fumar cigarro as coisas estariam mais fáceis. Havia momentos em que sentira uma fissura e isso quase lembrava os sentimentos inacabados que nutria por alguém do passado, sabia que era só questão de tempo até passar.

Era como uma dependência: sabia que não o fazia bem, mas a química deixava o cérebro querendo mais. Decidira se afastar da fantasia e se manter firme na realidade, já havia deixado para trás uma vez, conseguiria de novo.

Então, como o cigarro, odiava ficar contando os dias sem. Gostaria simplesmente que virasse algo do passado, o que não imaginava era o quanto difícil era conseguir parar de fumar cigarro. Mesmo contra a própria vontade, ia comemorando dia após dia, sabendo que bastava um deslize para ter que recomeçar tudo de novo.

Mas o que o cigarro e as pessoas tinham em comum, afinal? Primeiro, que fantasiamos como eles estão nos fazendo bem, quando na verdade, muitas vezes é o contrário. Também começamos sem imaginar que não será tão difícil viver sem e, às vezes por inúmeros motivos tudo se torna mais difícil do que parece.

E assim, como fumar um cigarro pode trazer uma espécie de conforto, ainda que saibamos o quanto nos faz mal, assim é um pouco parecido com quando temos algum grau de dependência emocional e ignoramos toda a parte negativa. O vício serve como um consolo temporário e uma mentira de disponibilidade sempre que necessário, mas são como palavras jogadas ao vento. E o que se inicia como um simples ato, acaba se tornando uma prisão difícil de se libertar. 

Já não contava só os dias, mas também as semanas, mas a verdade era que como qualquer vício, era uma luta ficar sem. Tudo o que poderia fazer era torcer para que a fissura ficasse mais fraca e menos frequente ao passar dos dias e, então, se libertar – ainda que alguns relatassem sentir fissura mesmo após anos. Sabia o quão difícil era lidar com dependência, mas de alguma forma esperava que fosse ser mais fácil. 

E assim, era a doce ilusão do início de que conseguiremos parar quando quisermos, mas há dias em que parecem mais complicados do que pensamos, dias que só queremos esquecer, dias que se pudéssemos voltar no tempo, jamais teríamos começado. Enfim, dias em que caminhava mais em direção à razão e menos na emoção, dias em que o bom senso era maior do que os desejos, dias para deixar para trás e saber aproveitar o momento presente.

*Ben Oliveira é escritor, formado em jornalismo. Autor do livro de terror Escrita Maldita, publicado na Amazon e dos livros de fantasia jovem Os Bruxos de São Cipriano: O Círculo (Vol.1) e O Livro (Vol. 2), disponíveis no Wattpad e na loja Kindle.

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