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Destaques

Sobre Reler Livros

Reler um livro era como tocar um tecido que você já usou várias vezes, como se fosse pela primeira vez. A textura parecia diferente; o cheiro não era o mesmo; Era impossível não imaginar na palavra que circulava pela mente: diferente.  E por que esperar pelo impossível igual? O leitor não era o mesmo. Um intervalo de tempo considerável havia se passado. O personagem que costumava ser o favorito talvez agora seja outro. O texto que escreveria a respeito do livro talvez jamais fosse igual. Era um diferente leitor, um diferente livro, uma diferente interpretação. Ler pelo mero prazer era diferente de ler pensando na resenha que escreveria em seguida. Escolher o livro de forma aleatória era diferente de já tê-lo em mente. Reler era diferente de ler, mas sobretudo, era uma nova forma de leitura: os detalhes que antes não chamavam a atenção, agora pareciam brilhar nas páginas. Não estava no mesmo lugar em que estava quando o leu pela primeira vez. Sua pele não era a mesma, tampouco seu céreb

Resenha: Bagagem Contada – Laís Camargo

Texto: Ben Oliveira

Livro escrito pela jornalista Laís Camargo e publicado em 2012, em Campo Grande (MS), pela Life Editora, Bagagem Contada leva o leitor a uma viagem junto com um grupo de turistas de diferentes regiões brasileiros e do mundo para os países vizinhos do Brasil, na América do Sul – Bolívia e Peru.

Para fazer esta viagem não é preciso mala ou mochila, tudo o que o leitor precisa é de disposição, paciência, imaginação, coragem e sensibilidade. Não falo da viagem física, mas daquela realizada ao folhear as 96 páginas de Bagagem Contada, que além dos textos, conta com imagens de tirar o fôlego.

Na primeira parada do livro, o leitor precisa estar preparado para mergulhar nas crônicas escritas pela jornalista Laís Camargo que na época da produção deste trabalho ainda era acadêmica de Jornalismo na Universidade Católica Dom Bosco (UCDB) de Campo Grande (MS) e consegue provar que o seu Trabalho de Conclusão de Curso foi bom para ser aprovado na banca e mereceu sua publicação com investimento do Fundo de Investimentos Culturais de Mato Grosso do Sul.

Os textos de Laís provocam diferentes sensações no leitor. Para quem já fez o mochilão ou até mesmo esteve junto dela, com certeza, nota que é impossível reproduzir totalmente todos os desafios, problemas e a satisfação daquela jornada, mas consegue reviver momentos inesquecíveis. Já aos que nunca fizeram esta rota, como eu, o livro é um convite para que o leitor observe o que por trás de tanta beleza e cultura, também existem a pobreza e os problemas sociais.

Mais do que um relato informativo, as crônicas transportam o leitor para cidades de contrastes explícitos, onde a miséria é vista de frente, existem pessoas corrompidas, porém também existem aqueles que mantêm esperança.

Algumas passagens do livro são marcantes, como imaginar o calor das cidades e nos ônibus turísticos, o estresse com a falta de organização das companhias de turismo e tentativas de ganhar a mais com os turistas de primeira viagem; a intoxicação alimentar e febre por causa da água e falta de higiene; a subida nas montanhas que exigem preparo físico e mental; o paralelismo entre belezas naturais e turísticas e as consequências da colonização e exploração destes países; a falta de ética, como o dono de um hotel que alugava os quartos, mesmo que já estivessem alugados, para quem pagasse mais, entre outras situações vivenciadas pela irmandade dos mochileiros.

Acompanhar este mochilão por meio das palavras da autora me fez pensar no quanto ainda os países sul-americanos são subdesenvolvidos em relação à Europa. Em junho de 2012, eu e um colega fizemos o nosso próprio roteiro, juntamos nossas mochilas e percorremos oito países europeus, ficando uma média de dois a três dias em cada lugar. Apesar da dificuldade linguística, algo um pouco difícil de acontecer quando brasileiros visitam a Bolívia e o Peru por causa do espanhol – esqueça toda aquela pressão e estereótipo de que brasileiros são os únicos a não falarem inglês fluentemente, existem lugares do continente europeu onde quase ninguém sabe a língua –, em termos de transporte e hospedagem, tudo é tão organizado que você pode reservar e comprar pela própria internet. É claro, assim como existem imprevistos e situações desagradáveis, como a de um dos membros que perdeu o documento – fato relatado em Bagagem Contada – e teve que pagar uma multa, enfrentei uma situação parecida em Praga, na qual as pessoas não falavam inglês e não sabiam informar onde e qual ônibus pegar para ir ao centro, além de não informarem que era preciso comprar o ticket antes de entrar no automóvel. Dentro do ônibus não havia cobrador, somente fiscais à paisana que entravam no meio do percurso e multava aqueles que não tinham comprado a passagem e lucravam com turistas desavisados, uma situação no mínimo frustrante.

Está vendo como uma viagem leva a outra? Comecei falando do livro e acabei compartilhando experiências pessoais. Mas mais do que conhecer um destino, sua cultura, arquitetura, pontos turísticos, como a jornalista Laís Camargo comenta, em um mochilão você conhece mais a si mesmo, explora melhor um lugar e reflete mais – é uma viagem para dentro de si.

Não há como se esquecer do prefácio escrito por Jacir Alfonso Zanatta – um dos professores mais fascinantes que já conheci, formado em filosofia, jornalismo e psicologia –, no qual ele fala um pouco sobre a leitura e elogia o texto da autora.

Além das aventuras vividas através das crônicas, Laís Camargo também realizou entrevistas para o livro-reportagem: Gesiel Rocha, jornalista e mochileiro que já visitou 25 países e aborda a diferença entre mochilão para a Europa e América do Sul, dá dicas e compartilha suas experiências; Neimar Machado, professor de História e Filosofia, Doutor em Educação, o entrevistado já comandou cinco excursões para a Velha Montanha – Machu Picchu e responde perguntas sobre a história e cultura da Região da Cordilheira dos Andes, comentando os efeitos da colonização e globalização na América Latina; Nilde Brum, Diretora-Presidente da Fundação de Turismo de Mato Grosso do Sul, na qual ela aborda a política pública para mochileiros e a necessidade de se investir no turismo regional e parcerias com os países de fronteiras, e Gilson Martins, Doutor em Arqueologia pela USP que fala sobre a construção de Machu Picchu, o Trem da Morte e sua primeira visita a região.

Para complementar os relatos da autora, no livro também estão os depoimentos dos companheiros da viagem: Yuri Ajala, Daniela Hernandes, Fabrício Basso, Thadynara Martinelli e Kássio Rezende.

Bagagem Contada é só mais uma prova de que o jornalismo aliado à literatura e às emoções pode dar certo, tornando uma leitura maçante e puramente informativa em uma viagem de aventura, literalmente.

Comentários

  1. Fiquei encantada e lisonjeada pelas palavras. Muitíssimo grata pela oportunidade. Bjsss (Laís)

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