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Destaques

A terceira semana sem fumar cigarro

Como era difícil criar hábitos positivos. Havia acabado de passar da terceira semana sem fumar cigarro e ainda sentia certo desconforto. Seja para bem ou para mal, descobrira que mesmo após anos, algumas pessoas continuavam lutando contra a vontade de fumar, ou seja, era muito mais difícil do que parecia. Na tentativa de substituir comportamentos negativos por mais saudáveis, se via diante da necessidade de se desapegar um pouco da nostalgia e voltar a se focar mais no momento presente. Havia tomado mais do que o suficiente sua dose de nostalgia e agora estava preparado para continuar seguindo em frente. Era chocante o quanto o cigarro havia segurado comportamentos e ao abandoná-lo, comportamentos que antes estavam sob controle, agora pareciam soltos. Precisava de um detox das redes sociais, como quem sabia que fumar fazia mal. Precisava voltar a focar em si mesmo, deixando o passado de uma vez por todas para trás. Era no momento presente que ia celebrando as pequenas conquistas. Para ...

Crônica - Madrugada na Augusta


Texto: Ben Oliveira

Deitado na cama, de olhos fechados, as imagens passam pela minha cabeça como se fosse ontem. É noite em São Paulo, sábado, um dia antes da maior Parada Gay do mundo, o relógio do celular, devidamente escondido pelo medo de ser furtado, está prestes a anunciar que já é domingo. Eu estou em uma das ruas mais recomendadas da capital paulista, cujo nome é tão sugestível quanto as coisas que você encontra percorrendo seu caminho, principalmente durante a madrugada - Rua Augusta é o seu título.

Meu corpo está todo dolorido, a cabeça doendo e a mente cansada. Após percorrer cada canto da Augusta, estou no conforto da minha casa, mas meus pensamentos me insistem em levar para aquele lugar. Estou andando rápido e em estado de alerta, como se estivesse lutando pela minha sobrevivência. Todos aqueles elogios e recomendações foram água abaixo assim que a realidade me confrontou. "Realmente, a Augusta deve ser um ótimo lugar para se visitar, quando se está de carro ou táxi, não quando você precisa percorrê-la andando", aquele pensamento gritava em minha cabeça.

Vi moradores de rua sorrindo enquanto dormiam naquele chão duro, em plena noite gelada, como se fosse tão confortável quanto a cama de um hotel, sonhando com dias melhores que nunca chegam. Um homem deitado próximo a sua mochila, quase foi assaltado por dois jovens que diziam "é só pegar e ele nem vê", me fazendo imaginar o que aquele rapaz teria de tão valioso para ser roubado. Vi dezenas de hippies vendendo seus artesanatos, sentados na escuridão e conversando entre si, como se fossem uma grande família. Skatistas se movimentavam com agilidade entre os carros e quase trombavam com as pessoas que estavam próximas.

Depois de ser alertado da existência de skinheads pela região, como não se sentir assustado com qualquer movimento estranho e pessoa que passa te encarando durante a madrugada? Até ouvir um rapaz todo de preto, com correntes enormes e olhos escuros, dizendo o quanto é nojento ver tantos gays reunidos em um só evento, me fazendo desejar estar em qualquer outro lugar naquele momento.

Andar pela Augusta foi uma aventura, da qual pretendo não repetir tão cedo, até mesmo por estar a quilômetros de distância da cidade neste exato momento. A miséria, as drogas e a criminalidade estão próximas de diversas casas noturnas, bares, restaurantes e lanchonetes da região. Para quem consegue enxergar as coisas só por um ângulo, talvez realmente o local seja ótimo para se visitar, porém quem pretende conhecer a rua Augusta como ela verdadeiramente é, basta andar centenas de passos em toda a sua extensão.

A rua Augusta de São Paulo abriga diversas atrativos para os jovens, mas em meio a tanto entretenimento, é preciso ficar esperto aos perigos. Depois de passar por pessoas oferecendo drogas, adolescentes sendo carregados, policiais que te encaram como se fosse um ladrão ou traficante e um homem enlouquecido gritando "pega ladrão", percebi que as coisas nem sempre são como são ditas ou como parecem. Toda aquela exaltação da cultura, não passava de uma válvula de escape para o caos. Como esquecer de um homem apertando o peito do meu amigo e perguntando "Quer apertar uns peitinhos hoje?" ou de uma mulher, segurança de uma dessas casas noturnas falando "Hoje tem pirocada na cara! Também tem bucetada"? - Frases que nos fizeram rir por horas na madrugada, mas que na hora assusta um pouco pela abordagem.

Acordo suando frio. Já não estou mais lá, mas nos meus sonhos os meus passos ainda são acelerados, minha respiração pesada e eu percorro aquela rua tão sombria, com pessoas de tribos diferentes, onde estar entorpecido ajuda a aliviar aquela sensação ruim e desconfortável de encarar a vida como ela é. Tão ruim quanto estar sóbrio em um grupo de pessoas bêbadas e se sentir como se não pertencesse lá, me senti um peixe fora da água que preferia continuar sem um aquário a ter que mergulhar naquelas águas obscuras e tóxicas.

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