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Destaques

Sobre Reler Livros

Reler um livro era como tocar um tecido que você já usou várias vezes, como se fosse pela primeira vez. A textura parecia diferente; o cheiro não era o mesmo; Era impossível não imaginar na palavra que circulava pela mente: diferente.  E por que esperar pelo impossível igual? O leitor não era o mesmo. Um intervalo de tempo considerável havia se passado. O personagem que costumava ser o favorito talvez agora seja outro. O texto que escreveria a respeito do livro talvez jamais fosse igual. Era um diferente leitor, um diferente livro, uma diferente interpretação. Ler pelo mero prazer era diferente de ler pensando na resenha que escreveria em seguida. Escolher o livro de forma aleatória era diferente de já tê-lo em mente. Reler era diferente de ler, mas sobretudo, era uma nova forma de leitura: os detalhes que antes não chamavam a atenção, agora pareciam brilhar nas páginas. Não estava no mesmo lugar em que estava quando o leu pela primeira vez. Sua pele não era a mesma, tampouco seu céreb

Resenha: Max Perkins: Um Editor de Gênios – A. Scott Berg

A biografia Max Perkins: Um Editor de Gênios, escrita por A. Scott Berg, narra a história de Maxwell Evarts Perkins, um dos homens responsáveis pela publicação de diversos escritores da literatura do século XX, como F. Scott Fitzgerald, Ernest Hemingway e Thomas Wolfe. O livro vencedor do National Book Award, de 544 páginas, foi publicado no Brasil, em 2014, pela Editora Intrínseca, com tradução de Regina Lyra. Max Perkins: Editor of Genius foi originalmente publicado nos Estados Unidos, em 1978.


Dividido em quatro partes, o livro explora diferentes períodos da vida de Max Perkins, mas todos acabam se voltando para sua paixão por editar livros, essencial para o seu sucesso no mercado editorial e para os autores que ele ajudou a lançar. Maxwell ia muito além do papel de um mero editor, muitas vezes, se comportando como um pai, um amigo ou um irmão dos diversos escritores que cruzaram seu caminho e colocaram nas mães dele o sonho de ver seus livros publicados.

“A melhor obra de um escritor deriva integralmente dele mesmo [...] O processo é muito simples. Se você tem um Mark Twain, não tente transformá-lo em Shakespeare nem transformar um Shakespeare em Mark Twain. Porque, no final, um editor só consegue extrair de um autor o que o autor tem em si mesmo”Max Perkins

Para quem está desacostumado a ler biografias, como eu, a leitura pode se tornar um pouco cansativa, mas a maneira que o texto foi estruturado torna cada pedaço de informação absorvido uma pequena conquista e um mergulho refrescante pelo universo dos bastidores das editoras e da metamorfose do escritor e sua criação literária para autor. A história de vida de Max é incrível e me atrevo a dizer que ele é o tipo de editor que muitos escritores sonhariam em ter para cuidar de seus manuscritos. Se aventurar na selva do mercado editorial vai além de ter o material escrito: das primeiras versões dos originais até sua impressão e distribuição, muitas coisas podem acontecer e não são todos os livros e autores que vencem e sobrevivem, literalmente, para colherem suas recompensas.


Max Perkins sempre dava um jeito para ajudar seus autores e alguns deles eram seus favoritos, a ponto de arranjar um tempo para dar seus conselhos a cada um deles, mesmo com o excesso de trabalho na editora, seu casamento não tão feliz com Louise que se sentia castrada pelo marido – deixara sua afinidade com o teatro –, sua admiração por Elizabeth Lemmon – com quem ele flertava e compartilhava suas histórias, alegrias e mágoas por meio de cartas – e o tempo com suas cinco filhas que vão passando por diferentes eventos ao decorrer do livro.

“Perkins, o aspirante a inventor, acreditava que o maior inventor do mundo jamais poderia se equiparar a um grande poeta. O primeiro “facilita a vida e a torna mais prazerosa desde que esse prazer venha de fora” [...] Ele melhora – se é que se trata de uma melhoria – o que nos cerca. Mas o poeta efetivamente muda quem somos. O grande poeta acrescenta muitos centímetros à nossa estatura espiritual e vemos e ouvimos e sentimos tudo de forma mais clara e profunda, para sempre mais ampla depois que ele nos encontra. Mesmo ele não nos alcance diretamente, somos alterados por conta da sua influência sobre outras pessoas e a dessas pessoas sobre nós, de modo que, no final, toda uma nação fica diferente graças ao poeta, para todo o sempre, como aconteceu com a nação inglesa pela mão de Shakespeare. Com efeito, aconteceu com o mundo todo. O mesmo pode se dizer de Homero e Dante”. A. Scott Berg citando Max Perkins

Embora Max não tinha pretensão de se tornar escritor, ele sabia como ninguém como manter seus autores inspirados, dando conselhos que ultrapassam questões de bloqueios criativos, alterações necessárias na narrativa, cortes e dando orientações sobre personagens, tramas e demais elementos da escrita de ficção e de não ficção. Ele também ajudava os escritores a lidarem com suas crises pessoais, como falta de confiança, excesso de autocrítica, perfeccionismo, problemas com álcool, conflitos em relacionamentos amorosos, depressão e demais pontos que permeiam a vida de artistas e acabam influenciando de maneira positiva e/ou destrutiva em seus processos de criação.

Além de apoiar psicologicamente e, muitas vezes, financeiramente os escritores, como aconteceu com Fitzgerald que ganhava muito dinheiro e depois se afundava em dívidas graças aos seus gastos, de sua esposa Zelda e seus vícios, um dos diferenciais de Max Perkins foi o de apostar em autores e seus estilos de escrita que não eram bem-vistos por outras editoras da época por causa dos temas abordados, da linguagem, da extensão, em alguns casos, como o de Thomas Wolfe, pelos personagens serem baseados em pessoas reais, seus dramas e situações que poderiam causar problemas judiciais.

“Escrever um romance é algo muito difícil porque cobre um espaço enorme de tempo e, se o autor se desencoraja, isso não é um mau sinal, mas um bom presságio. Se você acha que não está se saindo bem, em nada se difere da maneira como pensam os romancistas. Jamais conheci um que não se sentisse bastante desencorajado às vezes, e alguns chegavam mesmo a se desesperar. Para mim, isso sempre foi um bom sintoma”.  – Max Perkins

Para quem gosta de Literatura, universo editorial e tem interesse em saber como foi o início de carreira dos autores promovidos por Max Perkins, vale a pena a leitura! A biografia está recheada com os conselhos de um editor que sacrificava seu tempo livre, dinheiro e saúde para que as obras literárias fossem um sucesso, mesmo que isto significasse aguardar pacientemente durante semanas, meses e anos pelo material, passar pelas exaustivas revisões até que estivessem prontos para publicar. Mesmo sabendo da importância dos livros venderem, esta nunca foi a prioridade de Max, sendo que ele sempre deixou seus autores exercerem seus ofícios com criatividade, intervindo somente quando pedido ou necessário.

Max Perkins: Um Editor de Gênios foi escrito com base em pesquisas feitas por A. Scott Berg que se iniciaram em 1981, por meio da qual ele tentou evitar obter materiais de segunda mão e investigou fontes primárias, como cartas escritas e recebidas por Perkins, originais editados por ele e por meio de entrevistas com pessoas que conheciam o editor.

O leitor acompanha desde o início da carreira de Max como editor, seu casamento com Louise e problemas devido às diferentes personalidades, as trocas de cartas com Elizabeth, seu receio com autoras até o seu envelhecimento, álcool, perda de amigos, colegas e escritores que eventualmente morreram e o seu próprio fim. Uma biografia inspiradora sobre um homem que soube como sair da zona de conforto no meio profissional, sempre preparado para espalhar sua sabedoria e compreensão para os artistas, mas que na vida pessoal se sentia preso em seu próprio casamento e seus valores herdados de sua criação.

Sobre o autor – A. Scott Berg, formado pela Universidade de Princeton, foi agraciado com um Pulitzer por Lindbergh e um Guggenheim Fellowship por Goldwin: a Biography. É autor também de Wilson, biografia do presidente americano Woodron Wilson, e de Kate Remembered, obra de memórias sobre Katharine Hepburn. A. Scott Berg mora em Los Angeles.

Comentários

  1. Oi Ben,
    Você tem razão. Qualquer escritor tem o sonho de ter um Max Perkins como editor ou agente literário.
    O livro é muito bom e gostei de sua resenha, que passa uma boa visão da obra.
    Abraços,
    Silvio T Corrêa

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    1. Oi, Silvio!
      Primeiro, muito obrigado pela visita! :-)
      Concordo contigo. Um editor que está lá pelo autor, para inspirar confiança, criatividade e apoio psicológico. Por um mercado editorial com mais Max Perkins!
      Grato pelo feedback sobre a resenha. Feliz que tenha gostado.
      Abraços!

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  2. Não curto muito biografias, mas em se tratando de alguém com uma vida tão rica e, principalmente, sendo o editor de escritores tão fundamentais, seria difícil se entediar. Pelo contrário, deve ser uma leitura deliciosa, pois além de conhecermos mais sobre essa figura curiosa, também acaba-se sabendo mais sobre os autores editados por ele.

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    1. Oi, Ronaldo! Confesso que não tenho esse hábito de ler biografias, mas algumas delas me interessam: por exemplo, estou louco para ler a do Stephen King.
      É um aprendizado grande a leitura de Max Perkins: Um Editor de Gênios, pois dá para conhecer mais sobre o processo de criação literária de autores, como o Fitzgerald, Hemingway e Thomas Wolfe.
      Abraços

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    2. Ben, Ronaldo,
      Volto aqui, para comentar sobre essa biografia.
      Assim como vocês, também não sou ligado em biografias, mas essa ─ mérito de A. Scott Berg ─ tem uma costura muito boa.
      Citando um exemplo: para quem leu "Paris é uma Festa", estará bem à vontade em diversos trechos da biografia de Max Perkins.

      Abraços,
      Silvio

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    3. Silvio, estou louco para ler Paris é uma festa!
      Muitos livros para ler, pouco tempo de vida! Vou precisar de mais algumas encarnações para ler tudo o que eu quero.

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  3. O livro é bom. Hemingway é um "grande fofoqueiro". rsrsrsrs

    Ontem à noite peguei o livro para ver se o nome do Perkins aparece. Sim, aparece e eu nem sabia quem era Maxwell Perkins. O nome dele surge quando Hemingway conta como conheceu Fitzgerald.

    Quando tiver oportunidade, leia; Mas bem sei sobre esse negócio de tempo, e quanto aos livros, parece que não combinam. A pilha de livros para ler aumenta e o tempo diminui.

    Abraços,
    Silvio

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  4. Olá.

    Vim conferir a dica de leitura, acho que é bem o que eu estou precisando no momento, meu conhecimento a respeito de editores é quase nulo e eles tem um papel tão importante!!

    Adoro a vida maluca do Fitzgerald, ele realmente precisava de um super editor rsrs.

    Em biografias indico, caso não tenha lido, "Clarice," da editora Cosac (não compre a edição de bolso é terrível!!), a narrativa é tão bacana que as vezes eu esquecia o fato de estar lendo uma biografia.

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    1. Oi, Bibbi!
      Ainda não li, mas morro de vontade. Obrigado pela indicação! ♥
      Clarice Lispector é fascinante.
      Abraços

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