Reaprender a aproveitar os dias de calma. Ocupar a mente com coisas boas. Ter confiança de que nem tudo precisa se repetir, que a ansiedade pode ser muito mais do que um incômodo, mas conduzir para o caminho errado. Estar no escuro e estar cercado de alarmes podem ser terríveis. É preciso uma dose de equilíbrio para que os dias voltem a se tornar leves. Às vezes, o viés pode atrapalhar. Os padrões podem dar falsos positivos. É preciso paciência para identificar as coisas como elas são e não enxergar um padrão em tudo. Muitas vezes, é somente com uma rede de apoio que descansar se torna possível. Não ficar ansioso o tempo inteiro e criando cenários catastróficos também faz parte do tratamento. Deixar as coisas fluírem e abrir mão do controle total. É somente ao abrir mão do controle que é possível respirar com calma. É somente quando se está seguro que é possível manter vínculos saudáveis. É somente ao aceitar que o excesso de controle era pior do que não ter qualquer control...
A leitura e o mar. Se você prestar atenção neles, vai perceber que os dois têm mais coisas em comum do que imaginamos. Neste movimento de avançar e recuar, de crescer e arrebentar, de carregar e desapegar, acabamos aprendendo mais sobre nós mesmos.
Alguns livros são como praia em dia frio. A água está tão gelada, que temos receio de molhar os pés – é preciso coragem para encarar o desafio. De repente, nos damos conta de que não está tão congelante quanto imaginávamos. Nunca teríamos descoberto, se não tivéssemos ousado sair da nossa zona de conforto.
Há autores que seguram nossas mãos e conduzem até o mar, nos mantendo confortáveis e aquecidos, bancando o salva-vidas para quando precisarmos. As ondas nos balançam com tanta delicadeza, que é como ser abraçado pelas águas. Nos sentimos tão leves e fluidos. A tentação de ficar para sempre ali é grande, mas podemos sentir as areias nos nossos pés, um lembrete de que a qualquer momento é hora de voltar para casa.
Outros nos levam a desafiar nossos limites – somos hipnotizados pelo canto da sereia e continuamos indo cada vez mais fundo, sem nos importarmos se é perigoso ou não… Queremos nos afogar e beber tanta água salgada até perdermos nossa consciência, até chegar até a última página. Queremos desesperadamente fazer parte daquelas histórias, rasgar nossa pele e nos colocarmos dentro daquelas personagens, mesmo que o sal faça arder cada corte.
Entre afogamentos e encantamentos, querendo ou não, uma vez em contato com essas narrativas, é muito difícil não deixá-las nos transformar. Queremos a brisa tocando nossos cabelos e acariciando nossas almas. Queremos livros que façam nossos corações baterem com mais força, que nos façam sentir vivos – leituras que recarreguem nossas energias e nos aliviem do angustiante peso do cotidiano.
Deixamos nossos fragmentos de pele, cabelos e energias no mar que se misturam com o sal e a areia. Como toda boa leitura, ao mergulhar nas páginas e sentir as letras nos invadindo, também vamos deixando nossas marcas no livro. Saímos da praia, mas parte dela permanece conosco. Não somos os mesmos de antes, não somos os mesmos de depois. Como o mar, continuamos transformando e espalhando nossas histórias por aí… Até o dia em que entramos em outras águas, deixamos outras ondas desafiarem nossas estruturas e o ciclo recomeça.
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