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Destaques

Sobre Reler Livros

Reler um livro era como tocar um tecido que você já usou várias vezes, como se fosse pela primeira vez. A textura parecia diferente; o cheiro não era o mesmo; Era impossível não imaginar na palavra que circulava pela mente: diferente.  E por que esperar pelo impossível igual? O leitor não era o mesmo. Um intervalo de tempo considerável havia se passado. O personagem que costumava ser o favorito talvez agora seja outro. O texto que escreveria a respeito do livro talvez jamais fosse igual. Era um diferente leitor, um diferente livro, uma diferente interpretação. Ler pelo mero prazer era diferente de ler pensando na resenha que escreveria em seguida. Escolher o livro de forma aleatória era diferente de já tê-lo em mente. Reler era diferente de ler, mas sobretudo, era uma nova forma de leitura: os detalhes que antes não chamavam a atenção, agora pareciam brilhar nas páginas. Não estava no mesmo lugar em que estava quando o leu pela primeira vez. Sua pele não era a mesma, tampouco seu céreb

The Women and the Murderer: Documentário sobre Serial Killer que atacou mulheres em Paris nos anos 1990

Para quem gosta de documentários de crimes reais, mas já enjoou de produções norte-americanas e britânicas, o documentário francês The Women and the Murderer (Les femmes et l'assassin as called in France) foi lançado neste 9 de setembro de 2021 na Netflix e explora a história da mãe de uma das vítimas e de uma chefe da polícia na busca por um assassino em série que atacou várias mulheres em Paris, nos anos de 1990.

Dirigido por Mona Achache e Patricia Tourancheau, o documentário mostra o protagonismo não só das duas mulheres, mas também das advogadas e de uma jornalista que embora tivesse informações sobre o caso, manteve o sigilo para não atrapalhar as investigações sobre o caso – uma ação que nem sempre é respeitada pela imprensa e, além do pânico, poderia levar a fuga do assassino, especialmente porque na época não existiam tantos recursos tecnológicos e em relação aos outros países, a França não tinha um banco de dados de DNA, entre outras ferramentas avançadas de criminologia.

Um dos pontos mais interessantes do documentário é o da diferença cultural, como não existiam muitos serial killers na França, quando a informação sobre os crimes foi divulgada nos jornais, criou uma histeria e houve quem contestasse, por acreditar que não existiam lá, pela diferença em quantidade de casos em relação aos Estados Unidos, por exemplo. A jornalista que cobriu o caso na época revelou ao documentário que, na época, o sistema francês era uma bagunça e não havia cruzamento de dados, bem como a noção da psicologia dos assassinos em série.

Temendo que outras mulheres pudessem ser vítimas do assassino – o que realmente aconteceu –, a mãe de uma das vítimas se manteve por dentro do desenrolar do caso e tentou fazer sua própria investigação paralela para encontrar o assassino, além de mesmo sabendo da importância do sigilo, não conseguiu manter para si quando soube que ele tinha matado outras mulheres após sua filha, contando sua história para os jornais na esperança de que as francesas pudessem se proteger, além de divulgar o retrato falado.

O modo como o assassino foi tratado também pode ser visto como algo peculiar em relação a muitos casos de serial killers. Talvez pela influência da psicanálise na França, em contraste com uma visão mais pragmática que leva em conta a neurociência nos Estados Unidos, Guy Georges foi visto por alguns familiares das vítimas e dos envolvidos como um produto da sociedade, a ponto de ignorarem como alguns assassinos podem ser dissimulados e manipuladores.

Cada familiar deve ter reagido à sua própria maneira, mas mesmo com a confissão prévia obtida pela polícia e posterior tentativa de negar seu envolvimento, sem despertar a reação de Guy Georges, ele provavelmente se safaria do sistema judicial. 

Ao tentar explorar a história de vida do assassino, em muitos momentos a impressão que passa é que tentaram encontrar justificativa para o injustificável: nesse ponto, ao desacreditar do modo de agir de assassinos em série, dependendo do julgamento, outras pessoas poderiam se tornar vítimas ao acreditar na mudança ou redenção, como a mãe de uma das vítimas chegou a acreditar e até mesmo trocou cartas com ele – como se fossem confiáveis, quando assassinos em série conseguem manipular policiais, psicólogos e psiquiatras.

Com um histórico de abandonos, não há dúvidas sobre as questões sociais no desenvolvimento psicológico, mas sem analisar os riscos de reincidência e questões cerebrais, não só mentais, seja por ingenuidade ao esperar o melhor do ser humano e torcer que todos podem melhorar, ou pela identificação e empatia com questões biográficas, muitos correm o risco de fazer mais mal à sociedade do que bem, ao dar o benefício da dúvida para quem cometeu crimes cruéis em série.

The Women and the Murderer é interessante ao narrar as dificuldades da época, mas também desperta dúvidas sobre como o assunto ainda seria tratado na França: ainda que pelo menos, em 1998, conseguiram a autorização para um banco de dados de DNA, do ponto de vista da criminologia, se em crimes sem muita gravidade é até essencial revisitar a biografia de criminosos como forma de dar o julgamento adequado, diante de assassinos em série, em muitos países, eles podem se livrar do sistema e continuar cometendo crimes e se aproveitando de características que criam um disfarce para suas personalidades sombrias. 

Essa lógica comum de focar nos traumas como reparação é similar a que possibilita algumas pessoas a permanecerem próximos de criminosos, não só por amor, mas pela esperança de que um dia mudarão e até mesmo de alguns profissionais que incentivam seus pacientes a reviverem experiências traumáticas e se manterem em relacionamentos abusivos, colocando a peso na vítima e não no agressor. Embora há quem não queira ver o lado monstruoso do ser humano, é justamente isto que torna alguns disfarces tão perfeitos para serial killers, que eles passam a vida toda sem serem descobertos, além de se tornarem vítimas potenciais pela ingenuidade já que muitos se divertem com o jogo de caça.

*Ben Oliveira é escritor, formado em jornalismo. Autor do livro de terror Escrita Maldita, publicado na Amazon e dos livros de fantasia jovem Os Bruxos de São Cipriano: O Círculo (Vol.1) e O Livro (Vol. 2), disponíveis no Wattpad e na loja Kindle.

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