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Destaques

Sobre Reler Livros

Reler um livro era como tocar um tecido que você já usou várias vezes, como se fosse pela primeira vez. A textura parecia diferente; o cheiro não era o mesmo; Era impossível não imaginar na palavra que circulava pela mente: diferente.  E por que esperar pelo impossível igual? O leitor não era o mesmo. Um intervalo de tempo considerável havia se passado. O personagem que costumava ser o favorito talvez agora seja outro. O texto que escreveria a respeito do livro talvez jamais fosse igual. Era um diferente leitor, um diferente livro, uma diferente interpretação. Ler pelo mero prazer era diferente de ler pensando na resenha que escreveria em seguida. Escolher o livro de forma aleatória era diferente de já tê-lo em mente. Reler era diferente de ler, mas sobretudo, era uma nova forma de leitura: os detalhes que antes não chamavam a atenção, agora pareciam brilhar nas páginas. Não estava no mesmo lugar em que estava quando o leu pela primeira vez. Sua pele não era a mesma, tampouco seu céreb

Resenha Eros e Civilização - Herbert Marcuse

Texto: Ben Oliveira

Eros e Civilização: Uma interpretação filosófica do pensamento de Freud, livro escrito pelo sociólogo e filósofo alemão Herbert Marcuse, em 1955, com o título original "Eros and Civilization - a philosophical inquiry into Freud", e traduzido por Álvaro Cabral trás uma visão filosófica e sociológica com base nas teorias freudianas e psicanalíticas.

Segundo o autor, o título da obra é otimista e indica como a sociedade industrializada avançada e os homens conseguiriam evitar a destruição e repressão, por exemplo, e conseguiriam sustentar os instintos vitais e lutar contra a morte. Todavia, outras formas de controle social foram implementadas para reprimir a necessidade de libertação dos indivíduos.

Entre as características da sociedade atual estão as pessoas que se adaptarem a contínua produção e consumo, a criação de novos inventos, as ações que tornam os produtos obsoletos, aos meios de destruição e a necessidade que as pessoas sentem de comprarem e renovarem seus produtos.

"O povo, eficientemente manipulado e organizado, é livre; a ignorância e a impotência, a heteronomia introjetada, é o preço de sua liberdade", através deste trecho escrito por Herbert Marcuse é possível entender sua opinião a respeito da vida em sociedade atual em que as necessidades instintivas se transformaram. De acordo com Herbert Marcuse, as mercadorias são os novos objetos da libido. O ódio pelo inimigo nacional ajuda a satisfazer a necessidade de agressividade do inconsciente e a democracia permite as pessoas a escolherem seus governantes e a participarem.

Para Herbert Marcuse, apesar de sermos cada vez mais livres, principalmente no quesito de liberdade sexual, também estamos cada vez mais presos a um sistema que prática crimes contra a humanidade para conseguir o que deseja. A liberdade econômica é comentada pelo autor que explica que os produtos dela são a pobreza e a exploração. Os escravos são parte do passado e as pessoas servem ao sistema, em nome do progresso, em uma espécie de servidão voluntária.

Quando o autor escreveu a tese de Eros e Civilização, ele argumentou que o seu propósito foi retratar como o homem conseguiria reconstruir o sistema produtivo, se libertar e se desenvolver, todavia o que se observou foi somente uma mudança do conflito. "As pessoas livres não necessitam de libertação e as oprimidas não são suficientemente fortes para libertarem-se", descreve Herbert Marcuse.

Ainda segundo Herbert Marcuse, todo o desenvolvimento técnico e científico ao mesmo tempo em que trouxe benefícios, também criou uma espécie de guerra em sociedade, na qual os cidadãos podem não perceber seus efeitos, mas as vítimas sentem. O sistema de exploração e repressão abrigam o desenvolvimento e seus produtos que possibilitam a destruição em massa.

De acordo com Marcuse, ao interromper o excesso de produção de bens supérfluos e destrutivos, o autor acredita que o homem deixaria de sofrer fisicamente e mentalmente. O autor ainda explica que toda a repressão e exploração gera uma produtividade agressiva e faz com que aconteçam guerras, nas quais mesmo sem saber exatamente como funciona a sociedade, os rebeldes sentem uma necessidade de libertação.

Ao mesmo tempo em que o sistema reprime os indivíduos, esta sociedade protege a vida, mas Herbert Marcuse acredita que a agressão retida é pior do que a agressividade natural em defesa da vida. Se o progresso continuar sendo valorizado desta forma, o sistema pode passar pela auto desintegração. Herbert Marcuse cita fatores como a necessidade cada vez maior de trabalho, o crescente desperdício de recursos, a criação de empregos desnecessários e o crescimento do setor militar ou destrutivo.

Em meio a essa guerra não tão invisível, o filósofo explica que os jovens estão na linha da frente, pois eles desejam viver e lutar contra a morte. Por mais que a vida seja prolongada através de recursos, a sociedade busca cada vez mais o "atalho para a morte", um sistema que só pensa no desenvolvimento econômico e se esquece do ser humano.

Herbert Marcuse explicou as fronteiras entre filosofia, política e psicologia já não existem e que os três estão relacionados. O filósofo explicou que através de sua tese ele buscou analisar a filosofia da psicanálise de Freud (suas implicações filosóficas e sociológicas), não ela em si. Freud acreditava que a história da civilização está atrelada à repressão do homem, condição prévia do progresso. Ainda de acordo com o Pai da Psicanálise, sem a repressão, o homem seria livre para fazer tudo o que o trouxesse prazer. "O Eros incontrolado é tão funesto quanto a sua réplica falta, o instinto de morte", acrescente Herbert Marcuse.

Sacrifício da libido, repressão e ausência de liberdade são alguns dos reflexos da civilização. O homem teve que aprender a controlar o seu instinto (impulsos primários) e diferenciou-se dos outros animais, transformando os seus instintos e princípios. O princípio do prazer transformou em princípio de realidade: a busca pela satisfação imediata é substituída pela satisfação adiada, o prazer torna-se restrito, as atividades lúdicas perdem espaço para o esforço laboral, a produtividade é cada vez mais incentivada e a segurança ganha destaque. Freud considerava esta transformação de princípios um grande acontecimento traumático no desenvolvimento do homem.

A repressão faz parte da luta pela existência, vista como eterna por Freud. O homem encontrou outras formas de prazer, como o desvio de energias sexuais para o trabalho. Essa visão dualista entre prazer e restrição foi relacionada com os conceitos de Eros e Thanatos, na qual o primeiro representa os instintos de vida e amor, enquanto o segundo define os instintos de morte e as compulsões repetitivas que substituem o princípio do prazer. Além de simbolizar o instinto de vida, o termo Eros utilizado por Freud, também representa a sexualidade.

O autor do livro também aborda a teoria de Freud e explica as principais camadas da estrutura mental, designadas como id, ego e superego. O id é considerado o domínio do inconsciente e instintos primários, na qual os valores morais são ignorados; o ego representa o mundo externo para o id, sua representação e controla o prazer, substituindo-o pelo princípio da realidade; o superego é o representante da moralidade estabelecida e é a camada responsável pela introjeção no ego de restrições externas, pelo sentimento de culpa.

Trabalhar é uma necessidade cada vez mais difundida. O trabalho que veio para substituir o prazer, segundo Freud, não consegue suprir a libido, pois às vezes a pessoa acaba fazendo o que não deseja somente para trabalhar para o sistema. "O tempo de trabalho, que ocupa a maior parte do tempo de vida de um indivíduo, é um tempo penoso, visto que o trabalho alienado significa ausência de gratificação, negação do princípio de prazer", descreve Herbert Marcuse. A repressão do homem significa o seu distanciamento de Eros (prazer) e a impregnação dos instintos de morte provocando desintegração pelos produtos criados por ele mesmo.

"O passado define o presente porque a humanidade ainda não dominou a sua própria história", Herbert Marcuse comenta sobre a necessidade de entender a relação com a identidade arcaica da espécie. Freud acreditava que o destino do universo está nos impulsos instintivos e nas modificações históricas. Segundo o psicanalista, o homem não consegue superar totalmente o complexo de Édipo, e mesmo antes de se formar o ego, algumas diretrizes já estão determinadas. A história da humanidade influencia bastante em quem somos hoje e como nos comportamos.

Herbert Marcuse aborda no livro a Dialética da Civilização e explica que para Freud, a culpa era importante para o progresso da civilização. A mesma culpa responsável pela infelicidade do homem, também pode ser reconhecida pela produção cultural, caso contrário, o homem ficaria submisso ao princípio do prazer. Segundo Freud, o sentimento da culpa é resultado tanto do medo da autoridade, quanto do medo do superego (autoridade interna).

Para o autor do livro, apesar do homem poder consumir diversos bens e serviços isso controla as suas necessidades e capacidades. "Em troca dos artigos que enriquecem a vida deles, os indivíduos vendem não só seu trabalho, mas também seu tempo livre", acrescenta Herbert Marcuse. Segundo o sociólogo, o homem tenta evitar o problema do ócio e de fazer suas próprias escolhas, distraindo-se com os novos e diversos inventos. Marcuse também aborda a produtividade, valor pelo qual o homem é avaliado por conta de suas realizações socialmente úteis. Esta produtividade é cada vez mais buscada, e cada vez mais o trabalho é segmentado e contraria o princípio do prazer. Razão e supressão são relacionados pelo autor do livro, sendo o primeiro termo considerado um instrumento para coação.

Comentários

  1. Ótimo resumo, vai ser muito útil.
    Minha monografia é sobre Freud e seu discurso sobre a educação e a vida social e o ultimo capitulo falarei de Marcuse ...
    Obrigado!

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    1. Roberto, fico feliz em saber que a resenha te ajudou!
      Boa sorte na sua monografia. Se puder compartilhá-la quando estiver pronta. Fique à vontade!
      abraço

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Ben Oliveira, o que era para Marcuse civilização ? e qual sua atuação na vida do indivíduo ?

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  4. Texto muito bom e confiável. Só faltou a referência do livro. :)

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    1. Olá, Jéssica. Fico feliz que tenha gostado do texto. Quanto à referência, é útil para trabalhos acadêmicos. Na internet, os textos são mais descompromissados.
      Gratidão pelo comentário e pela visita.
      Abraços

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