As estrelas continuavam brilhando no céu, mas não conseguia alcançá-las. Havia encontrado uma estrela tão brilhante, mas quando tentou aproximar a visão, percebeu que ela já estava ao lado de outra estrela. Entre a surpresa e o choque, logo tentou se esquecer do que havia visto: era a única coisa que restava a fazer. A empolgação inicial de encontrar estrelas dera espaço a uma certa preguiça misturada à letargia. Sabia que elas estavam em algum lugar, bastava o tempo certo para que elas aparecessem, mas já não se sentia tão confiante em sua busca e pensara que ter ficado preso o suficiente em outros formatos estava atrapalhando seus êxitos. Queria uma estrela que servisse como uma musa, algo praticamente impossível de encontrar, mas que sabia que estava ali em algum lugar esperando por ele. Talvez as expectativas fossem altas e irreais, mas depois de se queimar e gelar pela realidade era tudo o que precisava. Estrelas, novas, brilhantes, estrelas que ainda não haviam tocado seu coração...
Ganhei essa arte maravilhosa da Daniele Silva. Edgar Allan Poe é meu escritor maldito favorito e a lembrança de que o mundo pode ser cruel com quem tem sonhos. Ele pode ter morrido pobre e miserável, mas mudou o mundo com sua literatura. Mais do que uma inspiração, a figura de Poe me lembra sobre a importância de colocar os pés no chão e sobre como o processo de criação literária pode ser intenso, bem como serve para lembrar que muitos artistas sonhadores se sacrificam para ter reconhecimento e muitos morrem desconhecidos.
"Àqueles que sonham de dia, é dado a conhecer muito do que escapa aos que sonham apenas à noite" – Edgar Allan Poe, Leonora (tradução de Marcia Heloisa)
Todo escritor, ilustrador, artista, sonhador, enfim, todo aquele que tem como objetivos trabalhar com o ofício que ama luta nos primeiros anos até obter reconhecimento profissional. Poucas pessoas próximas sabem da importância disso. Muitos acham que é só um hobby e não se dão conta de quanto é investido para tornar possível. Cursos, leituras, buscar constantemente inspiração, praticar e comprar materiais e equipamentos adequados. São muitos investimentos, sejam financeiros ou de tempo.
A Dani é uma dessas artistas que tem tudo para decolar e quem sabe um dia viver de arte, embora a gente saiba que no Brasil não é tão fácil. Quando batemos o olho nos trabalhos de pessoas talentosas, geralmente percebemos que há um dom ali, embora ela mesma nem sempre reconheça como um. Desenhar ou escrever, a arte em geral exige um olhar diferenciado sobre as coisas. Não estou dizendo que os ofícios não possam ser aprendidos. Tudo pode ser treinando. Porém, algumas pessoas têm mais afinidade com a atividade que estão desenvolvendo e, muitas vezes, as coisas fluem com naturalidade.
"Desenhar não é um dom! Desenhar é observar cada detalhe de uma determinada situação e transmitir para o papel, é treinar o olhar, é observar minuciosamente as pessoas, as ruas, os lugares por onde passa. É estudar diariamente, tornar aquilo como hábito. É estúpido pensar que não se pode fazer algo por simplesmente pensar que "não leva jeito pra isso", se você ama algo deve fazê-lo todos os dias, até o dia em que finalmente dirá 'Eu sei desenhar'" – Dani Silva
Nada mais justo do que deixar aqui embaixo algumas indicações de links para quem quiser conhecer mais sobre as ilustrações da Dani Silva e quem sabe despertar o interesse de alguém. Comprando alguma arte dela ou fazendo encomenda, você acaba apoiando uma artista.
Tenho um carinho especial por Edgar Allan Poe. Desde que comecei a escrever meus primeiros contos, a temática de fantasia sombria sempre se fez presente de alguma maneira, ainda que nos sonhos ou mentes dos personagens. Ao lembrar que assim como ele, inúmeros escritores e artistas foram incompreendidos quando estavam vivos, não é uma sensação tão agradável, não só em termos de sucesso e sim de sacrifícios, de sobrevivência.
O que diferenciam muitos escritores e artistas é a persistência. Muitos querem fazer algo, mas não são todos que permanecem com o ofício e está tudo bem, objetivos não precisam ser iguais e realmente não é nada fácil, especialmente quando vive em um país em que algumas atividades não são valorizadas. No entanto, o preconceito e o desrespeito com quem tem as atividades como uma profissão é algo que precisa ser quebrado, ainda mais se ele vem do seu próprio meio artístico. É sempre mais fácil ou julgar, ou só procurar quando precisa de um favor e, ironicamente, parabenizar depois que essas pessoas conquistam algo depois de ralar muito e fazer parecer como se o sucesso tivesse caído do céu.
Como qualquer outra atividade, o ilustrador e o escritor batalham diariamente para melhorar, muitas vezes, enquanto você está dormindo. São escolhas que as pessoas fazem. Sim, são atividades prazerosas. Sim, são ótimas formas de praticar. Mas, não, nem todos fazem somente como um lazer ou entretenimento, existem várias pessoas que se dedicam durante anos à atividade e transformam em uma carreira tão lucrativa quanto qualquer outra. Óbvio que ao menos que seja alguém muito sortudo e talentoso, as coisas não acontecem tão rápidas.
Desde o momento em que publiquei meus primeiros contos, passei a me dedicar mais ainda à escrita e à leitura. Se eu disser que escrevo, literalmente, todos os dias, estarei mentindo, mas tento praticar o máximo possível. Além da escrita de ficção, por exemplo, uso o blog para rabiscar crônicas e escrever resenhas de livros e, de quebra, ajudo a criar conteúdos informativos sobre literatura.
Existem situações que só mudam quando conscientizamos as pessoas sobre suas importâncias. Infelizmente, a jornada de qualquer artista no Brasil ou no mundo não é fácil, mas sempre agradecemos quando vemos pessoas que levaram tantas pancadas da vida e não desistiram.
Edgar Allan Poe, por exemplo, teve que bancar a publicação de seu próprio livro de poemas, Tamerlane and Other Poems, e foi um fracasso e recebido friamente pela comunidade literária. Mesmo tendo trabalhado em vários lugares e lidado com uma série de perdas próximas, problemas com a bebida e de saúde, Poe só alcançou o sucesso anos depois. Além de escrever seus contos e poemas, ele trabalhou como editor em revistas literárias e não conseguia emplacar o seu nome.
Apesar de ter feito considerável sucesso com O Corvo (The Raven), publicado em 1845, ainda não era o suficiente. Foi somente com o apoio de poetas como o escritor francês Charles Baudelaire, responsável pela tradução da obra de Edgar Allan Poe para o francês, em 1852, que ele começou a se tornar mais conhecido e fazer sucesso pela Europa.
"Os ecos desesperados da melancolia, que atravessam as obras de Poe, têm um acento penetrante, é verdade, mas é preciso dizer também que é uma melancolia bem solitária e pouco simpática para o comum dos homens"– Charles Baudelaire
Em um mundo marcado por convenções literárias e muitos preconceitos, especialmente no universo dos livros e entre escritores, difícil não se identificar com a escrita de Poe e admirá-lo, descrito por Baudelaire, como alguém que tinha horror à convenção e tinha: "um vasto saber, o conhecimento de várias línguas, sólidos estudos, ideias colhidas em vários países, faziam dessa palavra um ensinamento incomparável".
Enquanto escrevia meu romance Escrita Maldita, não conseguia (e ainda não consigo) deixar de pensar em escritores como Edgar Allan Poe e observar que o ciclo continua se repetindo até os dias atuais. Quantos são os autores cujas loucuras, muitas vezes, não são frutos de seus insucessos? A necessidade de se encaixar nas convenções é elemento que destrói e catalisa muitas mentes e corações, fazendo com que eles trocassem suas almas pelos seus sonhos. Qual seria o destino deles se tivessem que desistir?
"Os personagens de Poe, ou melhor, o personagem de Poe, o homem de faculdades superagudas, o homem de nervos relaxados, o homem cuja vontade ardente e paciente lança um desafio às dificuldades, aquele cujo olhar está ajustado, com a rigidez de uma espada, sobre objetos que crescem, à medida que eles os contempla – é o próprio Poe. E suas mulheres, todas luminosas e doentes, morrendo de doenças estranhas e falando com uma voz que parece música, são ele ainda; ou pelo menos, por suas aspirações estranhas, por seu saber, por sua melancolia incurável, participam fortemente da natureza de seu criador"– Charles Baudelaire
Até onde você está disposto a ir pelos seus sonhos? Essa pergunta incomoda, pois a verdade é que ao longo da jornada de qualquer artista não existe um só caminho, muito menos garantia de que o seu trabalho será recompensado. O que existem são possibilidades e uma combinação de ousadia e loucura para persistir fazendo aqui que move o seu espírito e mesmo as pessoas mais próximas de você jamais conseguirão entender, ao menos que elas compartilhem de uma paixão tão forte quanto a sua. É como dançar entre corvos e mergulhar nas estrelas. Uma vez que você se inicia, precisa tentar e tentar e mesmo diante de tantos desafios, sempre vai ter uma voz que ecoa em seus ouvidos te dizendo para nunca mais pensar em desistir. Nevermore!
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