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Destaques

Sem talvez

Não havia talvez quando se tratava de pôr a própria saúde mental em primeiro lugar, especialmente quando o outro a estava negligenciando. Não havia talvez para continuar sustentando um relacionamento que não ia para frente, no qual o outro se negava a se responsabilizar e se colocava constantemente no papel de vítima. Não havia talvez quando você havia se transformado em uma espécie de terapeuta que tinha que ficar ouvindo reclamações e problemas constantes, se sentindo completamente drenado após cada interação. Já não havia espaço para o talvez. Talvez as coisas seriam diferentes se o outro tivesse o mesmo cuidado com a saúde mental que você tem. Talvez a fase ruim iria passar um dia. Talvez a pessoa ia parar de se pôr como vítima e começar a se responsabilizar. Eram muitos talvez que não tinha mais paciência para esperar. Então, não, já havia aguentado mais do que o suficiente. Não era responsável por lidar com os problemas do outro. Não era responsável por tentar levar leveza diante...

Dramas Coreanos: Do vício ao voltar a assistir outras possibilidades

Assistir dramas coreanos é viciante. Passada uma série e outra, você logo se vê em um labirinto cheio de possibilidades para explorar. Porém, quando você se dá conta que deixou e/ou não consegue mais assistir outras produções de outros países pode se tornar um problema. É como se você estivesse viciado, mas nem sempre se dá conta.

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Por que assistir outras produções nacionais e internacionais também são importantes? Muitos doramas ainda não exploram muito bem a questão da diversidade. Recentemente, por exemplo, foi anunciado que o drama Love In The Big City com personagens gays estava sendo boicotado na Coreia do Sul, algo tão comum em outros países ainda gera debates em uma sociedade conservadora.

Indiretamente ou não, por meios dos kdramas você vai absorvendo tanto elementos que são bem distantes da real sociedade sul-coreana: há quem fique sonhando com um Oppa, um homem que vá tratá-las gentilmente, sem esquecer que personagens da ficção são isso, personagens, e a vida real pode ser bem diferente.

Chega a ser engraçado o impacto, pois é uma das coisas que perguntam para professores de coreano nas redes sociais. Assim como acontece com atores que interpretam vilões no Brasil e são tratados mal como se fossem os personagens, acontece o contrário quando se tratam de dramas coreanos, cria-se uma ilusão de homens fofos e gentis, embora os próprios coreanos alertem em vídeos que a vida real é bem diferente.

“Amiga, eu quero visitar a Coreia do Sul. Eu quero conhecer um coreano”. Que dorameiro nunca teve esse pensamento? E muitos até mesmo pensam em cansamento, sem levar em conta as diferenças culturais. Se esse é o poder da ficção, de entreter e nos fazer crer no impossível, também pode se tornar algo negativo, especialmente quando muitas dessas produções acabam se focando na mesma coisa e deixando outras questões de lado.

Para quem está com dificuldades de assistir outras coisas que não sejam kdramas, recomendo tentar lentamente assistir séries, filmes e documentários de assuntos que costumava se interessar. Pode parecer bobeira, mas como brincam nas comunidades: uma vez dentro, dificilmente você consegue sair.

Os primeiros episódios de algo que não seja um kdrama pode parecer desconfortável: os ritmos podem ser completamente diferentes e menos previsíveis, mas talvez aí esteja a graça. Você não precisa necessariamente abandonar os dramas coreanos, pode tentar intercalar com produções de outros países e vai ver a diferença com que as questões sociais são retratadas.

Viver na bolha dos dramas coreanos é bem confortável, mas não podemos nos esquecer do termo Soft Power, utilizado para suavizar a imagem de um país. A Coreia do Sul é muito mais do que é visto nos kdramas e o país tem problemas como qualquer outro. Morder a isca e acreditar no lado fantasioso pode ser perigoso, desde as chances de conhecer alguém mal-intencionado, como descobrir coisas como o conservadorismo – parcialmente visto nos kdramas – é ainda tão forte.

É preocupante que tentem boicotar uma série pelo simples fato de terem personagens gays. Essa é uma imagem bem distante da que se espera de um país que tem apostado alto nas produções culturais. Às vezes, se distanciar um pouco do mundo dos dramas coreanos pode fazer bem ao permitir enxergar a realidade que tem sido ocultada: nem tudo são beijos nos últimos episódios e/ou casamentos de contratos, na vida real, na verdade, muitas pessoas da Coreia do Sul têm evitado relacionamentos, seja por questões sociais, seja por escolhas pessoais.

Quando perceber que existe vida fora da bolha dos dramas coreanos, você também vai se atentar a quantas coisas não são mostradas e o quanto isso acaba gerando certo incômodo. Não deveria ser normal ter tão poucos personagens gays em séries e gerar uma reação conservadora contra. Sem mencionar que apesar de romantizarem a Coreia do Sul, o preconceito contra estrangeiros (xenofobia) ainda é forte – há pouquíssima representatividade de imigrantes, por exemplo, quase como se eles não existissem.

Da próxima vez que se ver pensando que não vai conseguir assistir qualquer coisa que não seja coreana, veja também o mundo de possibilidades que você está perdendo. Pode parecer estranho falar isso para quem não entende como as produções sul-coreanas podem ser viciantes, mas aos poucos é possível retomar o equilíbrio e voltar a assistir um pouco de séries de cada país e se surpreender com a beleza da diversidade.

*Ben Oliveira é escritor, formado em jornalismo. Autor do livro de terror Escrita Maldita, publicado na Amazon e dos livros de fantasia jovem Os Bruxos de São Cipriano: O Círculo (Vol.1) e O Livro (Vol. 2), disponíveis no Wattpad e na loja Kindle.

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