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Para onde vão todas coisas que não dissemos?

Para onde vão todas coisas que não dissemos? Essa é uma pergunta que muitas pessoas se fazem. Algumas ficam presas dentro de nós. Outras conseguimos elaborar em um espaço seguro, como a terapia. Mas ignorar as coisas, muitas vezes pode ser pior. Fingir que as emoções não existem ou que as coisas não aconteceram não faz elas desaparecerem. Quando um relacionamento chega ao fim, pouco importa quem se afastou de quem primeiro. Mas há quem se prende na ideia de que se afastou antes – em uma tentativa de controlar a narrativa, como se isso importasse. O fim significa que algo não estava funcionando e foi se desgastando ao longo do tempo. Nenhum fim acontece por mero acaso. Às vezes, quando somos levados ao limite, existem relações que não têm salvação – todos limites já foram cruzados e não há razão para impor limites, somente aceitar que o ciclo chegou ao fim. Isto não significa que você guarde algum rancor ou deseje mal para a pessoa, significa que você decidiu por sua saúde mental em pri...

O Corpo Guarda as Marcas: Livro de psiquiatra aborda o Transtorno de Estresse Pós-Traumático

Guerras, pandemia, violência, criminalidade, acidentes, desastres climáticos, terrorismo… Motivos não faltam para a população aprender mais sobre trauma e o possível desenvolvimento de Transtorno de Estresse Pós-Traumático, uma condição que afeta não só a mente, mas também traz sintomas em diferentes partes do corpo e ainda não é tão compreendida e diagnosticada como deveria. 

Escrito pelo psiquiatra Bessel Van der Kolk, o livro O Corpo Guarda as Marcas (The Body Keeps the Score) joga luz no assunto que ainda não recebe a atenção devida dos profissionais de saúde mental, cujos sintomas podem ser confundidos com de outros transtornos e afetar não só os indivíduos, como seus relacionamentos. No Brasil, a obra foi traduzida por Donaldson M. Garschagen e publicada pela Editora Sextante, em 2020.

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O livro de Bessel Van der Kolk ajuda a entender porque pessoas podem reagir de forma completamente diferente ao mesmo evento traumático, bem como oferece melhor compreensão sobre a integração corpo-mente, muitas vezes, ignorada, fazendo com que muitas pessoas se foquem em sintomas físicos de forma separada e nunca chegando à raiz do problema, visto que como um mecanismo de defesa, algumas pessoas sequer se lembram das experiências de trauma que tiveram – enquanto outras podem ser atormentadas com frequência e viver em um constante estado de hipervigilância, passar por episódios de desregulação emocional, dificuldade de relaxar e confiar nos outros.

“Apagar a consciência e cultivar a negação são, muitas vezes, medidas essenciais para a sobrevivência, mas há um preço: perde-se o rastro de quem se é, do que se está sentindo e das pessoas em que se pode confiar” – Bessel Van der Kolk, O Corpo Guarda as Marcas 

Como acontece com inúmeros diagnósticos de transtornos mentais, dependendo do ângulo observado, um paciente pode ter um diagnóstico completamente diferente, que não necessariamente é uma comorbidade. O mesmo acontece com quem tem Transtorno de Estresse Pós-Traumático. O autor ressalta que o diagnóstico errado pode levar a tratamento errado e, consequentemente, ter resultados desastrosos na vida do paciente.

Embora seja psiquiatra, o livro passa longe de focar somente na questão de medicação para transtorno de estresse pós-traumático e até mesmo de terapia de fala – visto que, em muitos casos, algumas vítimas não tiveram base emocional sólida desde a infância e nem sempre a terapia proporciona melhoras. Bessel Van der Kolk parece ter a mente bem aberta na experimentação de práticas alternativas, como o yoga e o papel da arte (dança, teatro, entre outros) de forma geral para ajudar com a questão da autoestima e da autoimagem, muitas vezes, ambos elementos prejudicados em indivíduos que sofreram algum tipo de trauma.

“Compreender muitos dos processos fundamentais em que se baseia o estresse traumático abre as portas para um grande número de intervenções que podem reconectar as zonas cerebrais relacionadas à autorregulação, à autopercepção e à atenção. Sabemos não só tratar o trauma, mas, cada vez mais, preveni-lo” – Bessel Van der Kolk, O Corpo Guarda as Marcas

Mesmo que a intenção do autor seja das melhores, em alguns casos, ele costuma fazer comentários que podem entrar em choque com a visão neurocientífica, como a associação de alguns transtornos com o trauma, algo que já se sabe que nem sempre ocorre e até mesmo tem relação com genética. Por outro lado, seu puxão de orelha pode servir como um alerta para profissionais que fazem vista grossa sobre o histórico dos pacientes, especialmente quando os próprios pacientes reprimiram as memórias e elas provocam sintomas que podem se tornar recorrentes, pois o tratamento acaba sendo incompleto e focado em sintomas separados e não na raiz do problema. 

Para Bessel Van der Kolk, é impossível falar de trauma sem pensar nas questões sociais. Ele relembra, por exemplo, que muitos associam somente à guerra e se esquecem de questões como a violência doméstica e os incidentes com armas de fogo, questões cada vez mais comuns nos Estados Unidos. Apesar da influência de questões genéticas, ele ressalta que o lugar onde a pessoa mora e as questões sociais têm forte relação tanto com o desenvolvimento de estresse traumático, como com a possibilidade de obter diagnóstico e tratamento adequados.

“As pessoas podem aprender a se controlar e alterar comportamentos, mas apenas quando se sentem seguras para tentar novas soluções. O corpo guarda as marcas do trauma: se o trauma está codificado em sensações desoladoras e desesperadas, nossa prioridade é ajudar a pessoa a abandonar a reação de lutar ou fugir, ajudar a reorganizar sua percepção do perigo e administrar relacionamentos” – Bessel Van der Kolk, O Corpo Guarda as Marcas

O livro O Corpo Guarda as Marcas traz muitos insights sobre o estresse pós-traumático e relatos de profissionais e pacientes. Enquanto alguns profissionais correm o risco de desumanizar pessoas com determinados transtornos, Bessel Van der Kolk deixa bem claro o papel coletivo e a importância do entendimento para acolher e transformar relacionamentos. Se há coisas que só o indivíduo pode fazer por ele mesmo, muitas vezes, com o auxílio de profissionais de saúde mental, sem sombras de dúvidas, ter um olhar atento e empático pode fazer toda diferença e até mesmo auxiliar na identificação de traumas desde a infância e contribuir para o desenvolvimento de relações mais harmônicas. 

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*Ben Oliveira é escritor, formado em jornalismo. Autor do livro de terror Escrita Maldita, publicado na Amazon e dos livros de fantasia jovem Os Bruxos de São Cipriano: O Círculo (Vol.1) e O Livro (Vol. 2), disponíveis no Wattpad e na loja Kindle.

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