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Para onde vão todas coisas que não dissemos?

Para onde vão todas coisas que não dissemos? Essa é uma pergunta que muitas pessoas se fazem. Algumas ficam presas dentro de nós. Outras conseguimos elaborar em um espaço seguro, como a terapia. Mas ignorar as coisas, muitas vezes pode ser pior. Fingir que as emoções não existem ou que as coisas não aconteceram não faz elas desaparecerem. Quando um relacionamento chega ao fim, pouco importa quem se afastou de quem primeiro. Mas há quem se prende na ideia de que se afastou antes – em uma tentativa de controlar a narrativa, como se isso importasse. O fim significa que algo não estava funcionando e foi se desgastando ao longo do tempo. Nenhum fim acontece por mero acaso. Às vezes, quando somos levados ao limite, existem relações que não têm salvação – todos limites já foram cruzados e não há razão para impor limites, somente aceitar que o ciclo chegou ao fim. Isto não significa que você guarde algum rancor ou deseje mal para a pessoa, significa que você decidiu por sua saúde mental em pri...

Resenha: A Garota no Trem – Paula Hawkins

Uma mulher passa os dias indo e voltando de trem, tempo de percurso que ela usa para observar um casal apaixonado e acaba imaginando histórias sobre eles. Assim é o desenrolar inicial do livro A Garota no Trem (The Girl On The Train), da escritora Paula Hawkins, publicado no Brasil pela Editora Record, com tradução de Simone Campos, em 2015.

Uma, duas, três. O romance de thriller psicológico é narrado por três personagens do livro, mas quem tem mais destaque é Rachel Watson, uma mulher viciada em álcool que perdeu o emprego e está morando com uma colega. Com vergonha de admitir que está com mais problemas que já tem, Rachel vive enganando Cathy e passa o dia inteiro na rua, para que a amiga não descubra que além de estar sempre bêbada, isso acabou custando o emprego dela.


Megan Hipwell é a segunda personagem-narradora que aparece no livro. Assim como Rachel, Megan tem seus próprios segredos. A linha do tempo na história se divide de acordo com o momento narrado e é marcada no início dos capítulos, cabendo ao leitor prestar atenção na narrativa para não confundir o que está acontecendo com quem e quando, já que a autora adotou a narração em primeira pessoa – embora os pontos-de-vista e a forma de se expressar são bem nítidas, há algo em suas essências que se conectam.

“A culpa é minha. Eu sempre bebi – sempre gostei de beber. Mas acabei me tornando uma pessoa triste, e a tristeza cansa depois de um tempo, tanto para quem está triste como para todo mundo em volta. Então passei de alguém que gostava de beber à condição de bêbada, e não há nada que canse mais que isso”

A terceira personagem que narra a história é Anna Watson. Cada uma das mulheres tem uma personalidade contrastante, mas Anna é a mulher que se envolveu com o ex-marido de Rachel, Tom Watson. Ao longo do livro, Paula Hawkins vai nos dando mais informações sobre as personagens e nos permite entender melhor a dinâmica e a relação entre as três mulheres, à medida que o passado e o presente vão se costurando.


As primeiras partes do romance se desenvolvem de forma mais lenta. A inércia de Rachel e seus problemas com bebidas alcoólicas dão a sensação de circularidade, o que não deixa de ser uma realidade da personagem – e o fato de incomodar alguns leitores, só mostra como bem verossímil é a personagem. Os apagões que a personagem principal tem quando bebe demais é um dos pontos que acaba fazendo com que ela tente encontrar respostas sobre o que está acontecendo, principalmente, quando ela vê uma notícia sobre o desaparecimento de Megan, a mulher que ela costumava observar durante suas viagens de trem.

“De vazio, eu entendo. Começo a achar que não há nada a se fazer para preenchê-lo. Foi o que percebi com as sessões de terapia: os buracos na sua vida são permanentes. É preciso crescer ao redor deles, como raízes de árvores ao redor do concreto; você se molda a partir das lacunas”.

Entre os sentimentos de culpa de Rachel, o de proteção de Anna que teme que Rachel possa fazer algum mal a ela e a sua filha e os flashbacks do misterioso e doloroso passado de Megan, o leitor embarca nesse vagão das lamentações e viaja, em sua grande parte, na companhia de Rachel. Quanto mais nos aproximamos dos conflitos e da verdade, mais sentimos a tensão da narrativa e a curiosidade para descobrir que realmente aconteceu a Megan.

A alternância entre focos narrativos e linhas temporais prendem o leitor, mantendo-os suspensos e sedentos para saber o que vem a seguir. Quando não se pode confiar na própria memória e não se consegue sair do ciclo de autodestruição, a personagem que só queria ajudar acaba se envolvendo com as investigações, mas até que ponto é possível acreditar em suas palavras ou em sua imaginação? Dizem que todo narrador em primeira pessoa é suspeito, pois o leitor é levado a ver as coisas pela sua ótica. Imagine quando temos três narradoras...

“Não lembro das coisas... Tenho apagões e não consigo me lembrar onde estive ou o que andei fazendo. Às vezes fico me perguntando se fiz ou falei coisas terríveis, e não consigo lembrar. E se... se alguém me conta alguma coisa que eu fiz, a sensação é de que não fui eu. Não parece que fui eu. E é tão difícil se sentir responsável por algo que você não se lembra. Então nunca me sinto mal o suficiente. Eu me sinto mal, mas a coisa que eu fiz fica fora de mim. É como se não pertencesse a mim”.

Paula Hawkins leva o leitor por esse delicioso romance policial. Quando os segredos das três personagens começam a se revelar, entendemos mais sobre seus passados e a escolha da autora de usá-las como narradoras. Três destinos, mas realidades bem diferentes, embora todas tenham morado na mesma região. As singularidades delas e o desenrolar da trama nos fazem questionar tudo e todos, até o momento do clímax em que somos atingidos pela verdade.
Paula Hawkins, autora do livro A Garota no Trem. Foto: Divulgação / Kate Neil.

Sobre a autora – Paula Hawkins trabalhou como jornalista durante anos antes de se tornar escritora. A Garota no Trem é seu primeiro romance, e chegou ao primeiro lugar na lista de mais vendidos do New York Times e da Amazon na semana de lançamento, onde permaneceu por vários meses. Os direitos de tradução já foram vendidos para 41 países e uma adaptação cinematográfica está sendo produzida pela DreamWorks.

A adaptação para o cinema do filme A Garota no Trem (The Girl on the Train) tem lançamento previsto para o dia 13 de outubro de 2016 no Brasil. O trailer internacional do filme foi divulgado em abril de 2016. O filme foi dirigido por Tate Taylor e conta com as atrizes Haley Bennett (Megan Hipwell), Rebecca Ferguson (Anna Watson), Emily Blunt (Rachel Watson) e Laura Prepon (Cathy) nos papeis das personagens principais.

Assista ao trailer do filme A Garota no Trem:

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