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Destaques

Sobre Reler Livros

Reler um livro era como tocar um tecido que você já usou várias vezes, como se fosse pela primeira vez. A textura parecia diferente; o cheiro não era o mesmo; Era impossível não imaginar na palavra que circulava pela mente: diferente.  E por que esperar pelo impossível igual? O leitor não era o mesmo. Um intervalo de tempo considerável havia se passado. O personagem que costumava ser o favorito talvez agora seja outro. O texto que escreveria a respeito do livro talvez jamais fosse igual. Era um diferente leitor, um diferente livro, uma diferente interpretação. Ler pelo mero prazer era diferente de ler pensando na resenha que escreveria em seguida. Escolher o livro de forma aleatória era diferente de já tê-lo em mente. Reler era diferente de ler, mas sobretudo, era uma nova forma de leitura: os detalhes que antes não chamavam a atenção, agora pareciam brilhar nas páginas. Não estava no mesmo lugar em que estava quando o leu pela primeira vez. Sua pele não era a mesma, tampouco seu céreb

Resenha: Dois Garotos Se Beijando – David Levithan

Um beijo entre dois garotos pode mudar o mundo? Talvez não o de todas pessoas, mas talvez faça a diferença para aqueles que são tocados e sensibilizados. O livro Dois Garotos Se Beijando (Two Boys Kissing), do escritor David Levithan, é um romance que aborda um pouco do universo gay e dos desafios enfrentados na adolescência e juventude. No Brasil, a obra foi publicada pela Galera, selo da Editora Record, em 2015, com tradução de Regiane Winarski.


O livro é narrado em primeira pessoa por um narrador que viveu em uma época em que os gays morriam com mais facilidade de doenças, como a AIDS, pois faltavam tratamentos adequados e que precisavam lidar com a homofobia, intolerância e construir suas próprias famílias, muitas vezes, entre amigos, para preencher a solidão e encontrarem forças para seguir em frente – situações que persistem como uma realidade para alguns homossexuais, mas que com o passar dos anos está se tornando mais aceitável.

Do narrador nostálgico, o leitor passa a acompanhar o presente de alguns personagens, como os jovens Harry e Craig, Neil e Peter, Avery e Ryan, Tariq e o solitário Cooper. Cada um dos personagens lida com seus próprios conflitos internos relacionados à questão da identidade, gênero e orientação sexuais e a relação com o amor, a aceitação de família e amigos, o bullying, a homofobia e a violência.

“Uma coisa é mostrar a alguém sua melhor e mais limpa versão. É bem diferente deixar que ele conheça seu eu profundo e irregular”

Adolescentes à procura de respostas. Enquanto muitos desses jovens se sentem perdidos, ao longo da história, o narrador fala sobre a esperança que sua geração depositou neles e a oportunidade que muitos têm de viverem uma vida que para ele fora complicada e a tristeza de ver vários amigos morrendo. A trama vai desenvolvendo, os personagens também vão amadurecendo questões que os afligem, como poder ser quem você realmente é, sem temer ser vítima de violência física, rejeição ou indiferença.

Com delicadeza e sensibilidade, David Levithan se inspirou em alguns casos reais para escrever o romance – os quais ele compartilhou na nota do autor ao final do livro. Com a magia da ficção, o autor consegue nos mostrar as diferentes aflições humanas e assim como seus personagens, ele nos toca com essas linhas temporais que se cruzam e com uma dose de esperança para um possível futuro em que dois garotos se beijando, por exemplo, não provoque tanto estranhamento.

“Muitos de nós tivemos que fazer nossas próprias famílias. Muitos de nós tivemos que fingir quando estávamos em casa. Muitos de nós tivemos que ir embora de casa. Mas todos nós desejamos  que isso não fosse necessário. Cada um de nós desejou que nossas famílias agissem como família, que, mesmo quando encontramos uma nova família, não tivéssemos que deixar a outra para trás. Cada um de nós teria amado ser amado incondicionalmente por nossos pais”

Para apoiar um amigo gay que foi vítima da violência homofóbica, Tariq, dois ex-namorados Craig e Harry querem bater o recorde mundial do beijo mais longo. Já os jovens Avery e Ryan estão naquela fase inicial do relacionamento de trocas de confidências e reconhecimentos. Os namorados Neil e Peter são tão novos, mas conseguiram encontrar a felicidade, o amor e o apoio um no outro. Já Cooper se sente deslocado e desconectado do mundo, principalmente pela dificuldade de se aceitar e ser aceito pelos outros.

Apesar de ser deliciosa a experiência de acompanhar os dilemas e desafios dos jovens personagens, as histórias que o narrador vai compartilhando sobre a geração gay do passado também são fundamentais para despertar no leitor mais empatia e nos mostrar o quanto as coisas têm se transformado ao passar dos anos – pode não ser exatamente como esperamos, mas há situações que foram conquistadas pelos esforços dos que vieram antes.

“Há milhões de beijos para serem vistos, milhões de beijos a um clique de distância. Não estamos falando de sexo. Estamos falando de ver dois garotos que se amam se beijando… Todas as vezes que dois garotos se beijam, o mundo se abre um pouco mais. Seu mundo. O mundo que deixamos. O mundo que deixamos para vocês”

David Levithan nos leva para dar uma volta com seus personagens e acaba sensibilizando com suas narrativas que se entrelaçam. Dentro do próprio universo colorido, cada personagem sabe as próprias angústias e alegrias. Enquanto existir a homofobia e o preconceito, como bem lembra o narrador, a cena de dois garotos que se amam se beijando ainda é importante para demonstrar que somos todos humanos e devemos nos aceitar – até o dia em que a homossexualidade deixe de incomodar e as pessoas possam ser tratadas igualitariamente, sem ter medo do ódio e da ignorância. O livro Dois Garotos Se Beijando mais do que a história sobre só dois garotos, é a história de várias pessoas cujas vidas e destinos se cruzam, desta rede, muitas vezes, invisível que nos lembra: "Há tantos momentos aos quais você acha que não vai sobreviver. Mas você sobrevive".


Sobre o autor – David Levithan é autor de vários livros aclamados pela crítica, inclusive Will & Will – Um nome, um destino, escrito em parceria com John Green, o primeiro livro jovem adulto com um protagonista gay a entrar na lista do New York Times. Em Dois Garotos Se Beijando, Levithan volta a falar do tema usando sua sensibilidade incrível de sempre.




E você, já leu Dois Garotos Se Beijando? Ficou curioso para ler o livro? Comente!

Comentários

  1. Aaaah, esse livro parece muito amorzinho, tô doida pra comprar! *----*

    www.literaturaliteral.wix.com/litblog

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    1. Oi, Júlia!
      Gostei muito do livro, viu? O autor consegue retratar com sensibilidade as dificuldades desta geração gay mais jovem. Espero que goste da leitura!
      Obrigado pela visita e comentário.
      Beijos

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  2. Oi. Já estava com muita vontade de ler o livro, depois que li seu post aumentou ainda mais.
    Que bom que agora podemos ter esse tipo de leitura que retarda assuntos tão delicado e ainda tão criticado.
    Abraços 😚

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    1. Oi, Gisele!
      Fico feliz que tenha te influenciado a ler o livro do David Levithan. Espero que goste!
      Abraços

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  3. Oi, Ben! Tudo legal?

    Cara, já pensei em ler esse livro do David, mas fiquei meio que com o pé atrás... Mas então, me deparo com esta resenha que mostra não apenas o romance entre dois caras, mas também, a questão do preconceito, bullyng, entre outras questões que nós ainda enfrentamos em nossos cotidianos (infelizmente). Enfim adorei sua resenha. Com certeza agora irei comprar e darei a chance ao livro.

    Beijão,
    Irmãos Livreiros

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    1. Oi, Daniel!
      Eu confesso que antes de ler, também estava com o pé atrás e fui tomado pela curiosidade. O David Levithan me surpreendeu. O livro Todo Dia dele também é maravilhoso! No momento estou lendo Will & Will, mas não está sendo tão prazeroso quanto os outros dois.

      Abraços!
      Obrigado pela visita e pelo comentário ♥

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