Conectados, mas fora de sincronia. Era como os dois estavam. Não sabia como resolver a situação, antes que se tornassem dois completos estranhos. No meio de tantos ciclos terminando, tinha acreditado que um novo ciclo se manteria. As horas que passavam conversando se transformaram em minutos, e então, em segundos. Já sabia que isso ia acontecer e tentara antecipar o fim várias vezes, então por que estava tão incomodado? Sentia saudades e não sabia como verbalizar? Não importava. Foi deixando o outro cada vez mais livre, até que as mãos que um dia tinham se tocado se voltaram para os dedos que haviam deslizado pela última vez. Parte de seguir em frente era também como deixar as coisas irem, seguirem seu ciclo natural. Não adiantava criar qualquer forma artificial de manter o contato vivo, só precisava aceitar as coisas como elas eram. Cansado de aceitar que tudo tinha sua finitude, foi cada vez menos se abrindo a novos inícios – se todos estavam fadados ao fim, por que se dar ao tr...
A Teia de Germano é um romance para quem tem amor à arte de contar histórias e todos os elementos que envolvem esse belo ofício. Escrito por Roberto Muniz Dias, a obra faz o leitor viajar pelas histórias, através das memórias de Lúcio, um ghost writer contratado para escrever um livro biográfico do escritor aclamado Erich. As diferenças entre os dois são notadas nas primeiras páginas. Ao longo da leitura escuta-se uma voz: “Será que eles são tão diferentes assim?”.
Roberto explora a metalinguagem. Conta-se uma história dentro de outra história, ou melhor, “a obra sobreposta sobre a obra”. Com a tarefa de escrever sobre a vida de Erich, Lúcio conversa com o escritor que tanto admirava, analisa suas fotos, cartas, memórias e faz o que pode para tentar mergulhar na essência do outro. Neste processo de descoberta do escritor, ao mesmo tempo, ele acaba nadando no seu próprio “lago da linguagem”, como diria Stephen King, onde ficam nossas experiências mais marcantes, nossos medos e desejos do subconsciente.
Nesta mistura entre fluxo de pensamentos, cartas e diálogos, o leitor vai se envolvendo cada vez mais com personagens. Questionamentos sobre as coincidências vão surgindo. Lúcio reflete o que mudou no primeiro livro de Erich até o estado atual dele. O ghost writer gostava tanto do protagonista, Germano, um rapaz sonhador, que carregava seus sonhos, e agora seu autor estava velho e doente. Ao enxergar as desilusões e verdades de Erich, Lúcio refletiu sobre a própria existência, o amor, o equilíbrio.
“Parece-me que sempre estamos construindo e desconstruindo – ou alguém destrói para você”.
Procure as questões principais que levam alguém a se tornar escritor, – ou melhor, a receber o chamado do ofício, visto que, muitas vezes, parece mais uma vocação do que escolha –, e as encontrará no texto. A solidão e loucura, o resgate do passado, a efemeridade, a esperança, a dor e alegria, medos e incertezas, Há certa beleza na tristeza? A arte literária que faz o leitor se mover, se transformar, e assim como Lúcio, encontrar suas proximidades com o autor. Sente-se um aperto no peito, uma nostalgia, aquele instante em que nos confrontamos com o que escondíamos de nós mesmos.
“Germano e Lúcio cresciam em dois mundos diferentes, mas tentavam encontrar fórmulas para entender suas próprias histórias. Não sabiam o que era afeto, carinho, coisas que estavam além de seus conhecimentos. Vivem inventando alternativas para viver, mesmo cumprindo suas tarefas diárias. Encontravam no final do dia um movimento para viver outras histórias. E começaram a desenvolver hábitos parecidos: escondiam debaixo de seus colchões”.
Encontra-se a fragilidade humana. Se possível fosse espremer as páginas do livro, qual seria sua essência? A mesma busca de Lúcio acaba se tornando a jornada do leitor. Lágrimas, sangue, sonhos despedaçados, abandonos, lembranças que preferia reprimir, acontecimentos que você gostaria de ter cristalizado. Neste estranhamento, percebe-se que as familiaridades são mais do que coincidências, entre Germano, Lúcio, Isadora, Erich e o leitor. O romance traz um belo final catártico, numa tentativa de nos reinventarmos e ressignificarmos nossos passados.
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