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Pandemia: Crises de Ética e de Desinformação ficam escancaradas no Brasil
O que leva alguns profissionais de saúde a espalharem informações falsas sobre vacinas e recomendar tratamentos sem comprovação científica contra Covid-19 que já não são indicados por órgãos internacionais? O que faz políticos se posicionarem contra medidas sanitárias recomendadas a nível mundial para combater a pandemia? Por que algumas pessoas se recusam a tomar a vacina e outras estão tomando mais doses do que o necessário?
A pandemia de Covid-19 tá revelando um lado do brasileiro que muita gente desconhecia, mas não era necessariamente novidade: o efeito da desinformação na tomada de decisões relacionadas à área de saúde. É importante pontuar, no entanto, que essas ideias não surgem do nada, alguém planta a ideia e ela é compartilhada e de tanto circular, uma mentira é vista como verdade. Assim é o fenômeno da pós-verdade, que se sustenta pelas fake news.
As mídias sociais e declarações públicas feitas por políticos, celebridades e até mesmo profissionais de saúde que deveriam ter mais responsabilidade pelo que dizem, afinal, suas mensagens podem ter um alcance e provocar danos irreparáveis, estão ajudando a tumultuar a imunização brasileira contra a Covid-19.
Ideias nada novas foram recicladas nos últimos dois anos, como o mito de que as vacinas teriam chips. Algumas das fake news são tão absurdas que nos fazem questionar quem acreditaria nelas. A verdade é que há muitas pessoas que acreditam, tornando o trabalho da imprensa mais essencial ainda no combate à desinformação, mas também reforçando a importância dos posicionamentos das organizações de saúde e dos profissionais informarem corretamente à população.
Ao mesmo tempo em que a CPI da Pandemia tá investigando as ações e omissões do governo federal no combate à Covid-19, também tem jogado luz à questão do papel da desinformação nesse processo. A hipótese inicial foi de que o atraso da vacinação e outras atitudes incentivadas por políticos tiveram relação com o negacionismo e, recentemente, outros indícios foram descobertos, como de possíveis fraudes nos contratos de vacinação e até mesmo interesses lucrativos, enquanto parte da população se perguntava sobre a imunização, os hospitais estavam lotados de infectados e centenas de milhares de pessoas morriam.
Se lutar contra a desinformação comum já é algo complicado, quando se tratam de fake news de saúde é mais complexo ainda. Qualquer pessoa que se apresente como médico ou profissional de saúde pode passar informações erradas sobre o Covid-19, as vacinas e os tratamentos sem comprovação científica e não importe quantos outros profissionais contrários tenham se posicionado, o que prevalece muitas vezes é a crença do indivíduo e o valor que ele dá a quem está fazendo a declaração.
Um bom exemplo disso é o caso da CoronaVac. A vacina de origem chinesa tem sido atacada desde o início por alguns políticos. Mesmo sendo produzida pelo Instituto Butantan e com boa eficácia comprovada, muitos brasileiros têm receio de tomar a CoronaVac por causa de declarações repletas de desinformação espalhadas por figuras, como o presidente Jair Bolsonaro. Por trás das falas, alguns veem uma rixa política entre Bolsonaro e João Dória, o governador de São Paulo que apoiou a produção da vacina enquanto o presidente negava.
Há duas semanas, rumores de que o Ministro da Saúde Marcelo Queiroga encerraria o uso da vacina no país se espalharam e já foram negados há uma semana. Com as variantes do Coronavírus, há uma preocupação de que no futuro seja necessária uma dose de reforço, mas as informações que circulam em aplicativos de mensagens e redes sociais tentam criar um cenário catastrófico, fazendo muita gente ir ao posto de saúde e querer escolher a vacina que vai tomar, deixar de tomar a que tem disponível no momento ou mais grave ainda, tomar doses além do necessário de diferentes vacinas.
Um dos casos chegou a viralizar hoje na internet, sobre uma mulher que tomou duas doses da Coronavac e tomou uma dose da Janssen, que é vacina de dose única. O caso chegou a ser denunciado ao Ministério Público por meio do portal Fura-Fila da Vacina, criado para apurar denúncias de irregularidades na vacinação, como de quem não faz parte do grupo prioritário e tomou antes da hora, no estado de São Paulo.
Além da medida de tomar mais doses que deveria não trazer benefício, também pode atrapalhar a imunização de outras pessoas e quem tenta furar a fila pode ser multado de acordo com a lei estadual.
O mais chocante nisso tudo é que até médicos estão sendo investigados por burlar o sistema de vacinação, nos fazendo questionar como estão sendo tratadas essas questões éticas e, claro, a necessidade de um sistema mais eficiente de controle e informatização.
A questão foi levantada até mesmo pelo senador Izalci Lucas, do Distrito Federal, na CPI da Pandemia, reforçando a importância da informatização e controle não só das vacinas, mas também de outros medicamentos, para melhor transparência e menos problemas. O senador citou a Operação Falso Negativo, na qual a polícia federal investigou irregularidades em testes de Covid-19.
Em tempos em que a internet tem sido usada para compartilhar a alegria da vacinação contra Covid-19, também está sendo usada para encontrar irregularidades de quem conseguiu burlar o sistema. Mais do que revelar a crise ética, a pandemia tem mostrado o efeito nocivo de quem comete ações erradas e compartilha publicamente na internet sem qualquer receio.
O efeito da Pós-Verdade deu uma falsa permissão de que qualquer um possa usar as mídias sociais para compartilhar mentiras, fake news, praticar o exercício ilegal da medicina, charlatanismo e até mesmo infrações e nada vai acontecer: o que está bem longe da realidade. Talvez, muitos se sintam seguros ao fazer isso por verem outras figuras políticas, como Jair Bolsonaro, e da área de saúde fazendo o mesmo, o que não quer dizer que algum dia não possam responder pelos possíveis crimes contra a saúde pública.
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