Dezembro chegou e com ele veio a vontade de escrever novos capítulos de sua história. Estava disposto a deixar outubro e novembro para trás, tentar se focar no momento presente e se deixar perder nas novas linhas que se formavam. Era verdade que deixar os capítulos anteriores para trás não era uma tarefa fácil, mas precisava seguir em frente, sempre se movimentando em direção aos seus sonhos. Tentava não criar expectativas sobre que tipos de histórias iria escrever, o papel em branco que antes o paralisava, agora servia como um convite para deixar novas palavras surgirem. Escrevia pra quê, afinal de contas? Para se lembrar? Para esquecer? Para colocar para fora? Para simplesmente praticar o ato de escrever? Não havia uma resposta certa ou errada. Escrevia porque era sua paixão fazer isso e enquanto continuasse respirando, pretendia continuar escrevendo. Escrever capítulos novos poderia ser uma atividade interessante. Diferente do que muitos pensam, nem todos escritores deixam tudo plan...
Fake News de Saúde e Autismo: 10 Desafios de Combater o Charlatanismo
Estou só fazendo meu papel como jornalista de levar informações confiáveis. Para quem simpatiza com terapias sem comprovação científica que alegam curar o autismo, não leve para o lado pessoal. Se quiser levar, também já é uma questão sua para resolver internamente ou em terapia.
Repito: Até o momento, QUALQUER tratamento que alegue curar o autismo está sendo fraudulento. O autismo é condição neurobiológica para a vida. O que existem são pesquisas inconclusivas, gente que mente na cara de pau e/ou não tem conhecimento sobre neurociências.
Todo profissional de saúde tem dever ético de alertar sobre tratamentos falsos. Se a pessoa não alerta e ainda promete curas, abra os olhos.
Recomendo mais leitura sobre o assunto para ser menos enganado: mais livros sérios sobre autismo (nem todo livro é bom), mais pesquisas e estudos, mais conteúdos produzidos por organizações INTERNACIONAIS de autismo.
Desde que o autismo foi descoberto, teorias infundadas foram levantadas, especialmente por profissionais influenciados pela psicanálise que ajudaram a espalhar mitos como o dos pais e mães-geladeiras (relacionando o autismo a questões psicológicas) e interpretações totalmente incorretas sobre os comportamentos de autistas.
Para começar, é preciso lembrar que o autismo é uma condição neurobiológica e não existe uma causa única descoberta, embora saiba-se que a genética tem forte influência (não é tão simples como as pessoas imaginam) e fatores ambientais. Depois, precisamos lembrar que o autismo não é considerado doença, logo essa busca desesperada pela cura, além de ajudar com a negação e distanciamento entre pais e filhos, também ajuda a levantar mais preconceito das pessoas que não conhecem a realidade e ficam pensando que basta fazer alguma dieta do momento (remover glúten) ou usar alguma substância para 'deixar de ser autista'.
O cérebro do autista é diferente do cérebro do não-autista. Existem inúmeras variações entre os autistas, independente do grau, desde pessoas que precisam de muito apoio e podem ter deficiência intelectual, passando por autistas que precisam de menos apoio e não têm autonomia até os autistas que conseguiram desenvolver certo grau de autonomia e alguns deles podem ter inteligência acima da média.
Outro ponto a se levantar é que os estereótipos atrapalham o diagnóstico de autismo. Muitos autistas aprendem a camuflar seus traços ao longo da vida: prazer, eu sou um autista camaleão, como vários colegas e várias pessoas da comunidade autista internacional. Existem estudos e vários relatos sobre o assunto, mas no Brasil, muitos profissionais estão completamente desatualizados. Quem sofre mais com isso são as pessoas que precisam de diagnóstico e não conseguem um e sofrem preconceito e precisam ouvir comentários como “você não é autista, só é esquisita” (entre inúmeras variações de comentários preconceituosos que mostram o profundo desconhecimento sobre a diversidade do espectro autista.
Mas vamos ao que interessa. Faz mais de um ano que queria escrever este texto. No Brasil, temos uma epidemia de profissionais antiéticos/charlatões e de falhas da mídia na cobertura da área de saúde e pesquisas científicas. Existem muitos tabus, mitos, preconceitos, estigmas e mentiras sobre o autismo que precisam ser quebrados: muita gente tem uma visão de 1/3 do que é o espectro autista. Existem inúmeras variações dentro do espectro autista, independente do grau de necessidade de apoio.
Fake News de Saúde e Autismo: 10 Desafios de Combater o Charlatanismo:
1) Pensamento rígido:
Profissionais dizem que uma das características de pessoas no espectro autista é o pensamento rígido e eu deveria muito saber disso, afinal, sou autista (Síndrome de Asperger). Porém, pessoas não-autistas (neurotípicas) podem ser tão teimosas quanto, especialmente quando envolvem suas crenças.
As pessoas não sabem diferenciar pesquisas de qualidade e pesquisas com viés de confirmação (falsos positivos). É por isso que muita informação falsa sobre o autismo se espalha rapidamente pelo mundo, especialmente por causa de celebridades e dietas 'malucas' que alegam que remover o glúten pode curar o autismo ou pessoas influentes que fazem parte do movimento Anti-Vacina.
2) Interesses financeiros:
Já viu tratamentos sem pé nem cabeça que ficam populares? Já viu depoimentos de pessoas dizendo que fizeram e deu certo? Por trás de todo tratamento falso (sem evidências científicas), há alguém com segundas intenções influenciando. Para algumas pessoas, pouco importa o bem-estar da pessoa, desde que ela ganhe dinheiro vendendo produtos/tratamentos, independente do quão perigosos possam ser.
O dinheiro fala mais alto do que a vida: existem casos de autistas que morreram por causa de pseudotratamentos. Muitos desses casos são subnotificados, pois significaria para a família admitir que fez algo errado e expor problemas éticos de médicos e demais profissionais da saúde envolvidos com esses protocolos experimentais perigosos. O uso de protocolos exige uma transparência sobre os riscos que nem sempre existe.
A cultura da competitividade faz com que alguns profissionais achem que estão em uma corrida pela fama. Vale tudo pela atenção. Uma carreira sem base não permanece firme. Muitos profissionais conseguem destaque na mídia, mas basta uma rápida investigação para descobrir que muitos dos projetos e mentiras não se sustentam.
Desde graduações e cursos que nunca fizeram, até projetos inconclusivos, a mídia acaba ajudando a dar notoriedade para quem nem sempre merece. Depois, para corrigir os estragos pode ser tarde demais.
Um ótimo exemplo foi como os pesquisadores que disseram que autismo era causado por vacinas e isso acabou resultando no fortalecimento do movimento anti-vacina e em inúmeras mentiras sobre o Transtorno do Espectro Autista que são espalhadas até hoje. Até desmentirem as pesquisas, muitos danos foram provocados e ainda são. Diariamente, a comunidade autista internacional lida com profissionais, pais e até mesmo pessoas no espectro autista que acreditam no mito da vacina.
Muitos de vocês conhecem a brincadeira popular Telefone Sem Fio. Cada um fala uma coisa para o outro e quando vai ver, a mensagem final pode ser bem diferente da mensagem inicial. No mundo do autismo e da saúde não é tão diferente.
Experiências pessoais e sem evidências científicas são espalhadas pela internet, páginas no Facebook, blogs, grupos de redes sociais e Whatsapp e quando nos damos conta, várias pessoas estão seguindo recomendações sem pé nem cabeça.
É importante tomar cuidado na hora de produzir conteúdo. Eu, por exemplo, tento sempre ressaltar que não existem dois autistas iguais, mesmo Aspergers. Uma das pessoas no espectro com quem tenho mais afinidade é bem diferente de mim... Imagina o resto, então?
5) Celebridades não são pesquisadores:
Você provavelmente já deve ter lido ou ouvido falar de alguém que se curou do autismo. Bom, não existe cura para o autismo, mas as pessoas falam o que elas querem e sempre há alguém sem conhecimento para acreditar.
Há mais de dez anos, uma atriz norte-americana espalhou que o filho dela se recuperou do autismo porque cortou o glúten da dieta. Desde então, inúmeras famílias tentam seguir o conselho, mesmo que não existam pesquisas que sustentam a hipótese e as que existem são de baixa qualidade. Esse é o risco de quando a mídia dá visibilidade para quem não deveria.
Quantas entrevistas com pessoas no espectro autista você já viu na mídia? Quantas palestras já assistiu? Quantos conteúdos: livros, vídeos, podcasts, quadrinhos, blogs [etc.]? No mundo inteiro existe uma disputa de narrativas no mundo do autismo. Um dos escândalos mais conhecidos é de uma das maiores organizações de autismo do mundo que conta com uma participação mínima de autistas na sua equipe.
O mundo inteiro copia os Estados Unidos. O mundo inteiro enfrenta o mesmo problema. Desde casos de difamações de autistas: pessoas que espalham que compramos laudos, que nossos diagnósticos estão errados, que nós inventamos informações, que somos contra tratamentos (mentira), que só nos importamos com nosso grau de autismo e não nos importamos com autistas de outros graus (outra mentira) e por aí vai.
7) Religião, Espiritualidade e Negação:
A influência da religião e espiritualidade no Brasil é muito forte. Muitas pessoas negam inúmeros diagnósticos por causa das duas coisas. Existem várias pessoas que apresentam desde problemas sensoriais relacionados ao Transtorno do Processamento Sensorial (com ou sem autismo), TDAH, entre outras condições e transtornos psicológicos.
Nós vivemos no país que tem um dos maiores índices de ansiedade do mundo. Muitos quadros de depressão e muita gente que nega os dois transtornos, quem dirá algo mais complexo como o autismo?
Isso afeta a quantidade de pessoas que busca um diagnóstico formal. Seja pelo estigma ou pelas crenças, muitas pessoas fogem do diagnóstico e de tratamentos para comorbidades (ansiedade, depressão, transtorno bipolar, borderline, TDAH, transtornos de aprendizagem, esquizofrenia, síndrome do pânico, fobias, TOC etc.). Então, em vez de aceitar um diagnóstico, seja ele qual for, muita gente prefere usar terminologias espirituais para explicar os diferentes funcionamentos neurológicos/mentais.
Muitas famílias fogem de tratamentos sérios, o que acaba atrapalhando o desenvolvimento de autistas, em troca de promessas falsas de cura na igreja e em outras religiões. O Brasil precisa de mais incentivo e contato com a ciência.
O baixo investimento em educação atrapalha tudo no Brasil, desde a questão do desinteresse pela leitura, pela busca do conhecimento, reciclagem profissional até a dificuldade com interpretação de texto. Faltam políticas de identificação de alunos e pessoas com transtornos de aprendizagem, bem como de mais incentivos e estímulos para pessoas com Altas Habilidades (Superdotação).
A falta de diagnóstico de transtornos de aprendizagem e a dificuldade com compreensão e interpretação de texto influenciam na leitura do mundo. No Brasil, há um receio de 'rotular pessoas com diagnósticos'.
É preciso lembrar que diagnóstico não serve para rotular, mas para dar orientação.
Sem investimento nas escolas e em serviços de saúde mental desde a infância, estamos destinados a repetir os mesmos erros do passado, além de desperdiçar muito potencial criativo e intelectual. O país também lida com a fuga de cérebros: pessoas que decidem estudar e trabalhar em outros países por inúmeros motivos, entre eles, a falta de espaços e oportunidades para desenvolvimento.
9) Formação de jornalistas sem entendimento da base científica:
Cada curso de jornalismo tem sua grade curricular. Várias graduações contam com disciplinas como metodologia científica, mas mesmo pessoas da área da ciência podem ser confundidas por pesquisas de baixa qualidade. Talvez não seja completamente justo culpar jornalistas por informações duvidosas de saúde, mas é preciso que haja essa consciência nos cursos de graduação e nos espaços de atuação profissional.
Com tantos cortes em redações jornalísticas, muitos profissionais precisam se virar para produzir várias reportagens por dia. Também tem a questão de que mesmo com a apuração nem sempre o jornalista tem como saber com detalhes sobre a pesquisa, seus resultados, se existem interesses financeiros por trás e por aí vai.
10) Fraudes e crimes no mundo do autismo:
Quem acompanha minha página desde o início, sabe que eu não 'escolho lados'. Tento ser o mais transparente e independente possível. Toda história tem três lados. Nos Estados Unidos, existem clínicas e pais que estão sendo processados por planos de saúde e pelo Governo nos casos de tratamentos que não são necessários.
Em caso em que há necessidade, acredito que é importante ir atrás do direito. Mas sou contra qualquer forma de fraude. Nem todo autista precisa de determinadas terapias, por exemplo, especialmente os casos mais 'leves' que têm mais 'desenvolvimento'.
Nos EUA e em outros países, isso está causando um rombo de milhares de dólares. O Governo e empresas estão começando a avaliar caso a caso e alguns profissionais antiéticos da área da saúde estão sendo punidos, especialmente os que recomendam tratamentos falsos.
Antes que vire moda no Brasil, como aconteceu com os tratamentos falsos, já deixo a dica.
Outro problema recorrente fora é o de familiares de pessoas com deficiência que usam o dinheiro de benefício assistencial para outras coisas e se esquecem dos cuidados, levando aos casos de negligência e abandono.
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